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Crítica | Emilia Pérez

Foto do escritor: Gabriella FerreiraGabriella Ferreira

Filme tenta ser revolucionário, mas entrega história carregada de estereótipos latinos

Foto: Divulgação


Com uma premissa instigante, misturando uma trama de ação com drama e cenas musicais, o longa Emilia Pérez, que chega aos cinemas brasileiros em fevereiro, começa nos apresentando uma advogada descrente com a profissão que acaba sendo contratada por um dos maiores narcotraficantes do México para ajudá-lo para que ele possa finalmente se tornar a mulher que sempre sonhou ser.


Uma pena que a história do francês Jacques Audiard tropece na sua própria proposta ao apresentar uma trama que não vai além do básico, que neste caso é uma visão deturpada, fetichista, eurocêntrica e xenófoba de um México incapaz de produzir algo além da violência. A catástrofe se encontra na medida que suas tentativas de debate e problematização são esvaziadas por um olhar que parece não decidir se se leva absurdamente a sério  ou se cria involuntariamente um humor ácido (que, muitas vezes, beira a vergonha alheia). 


No mais, vamos ser justos. A primeira parte de Emilia Pérez realmente convence, muito pela curiosidade de sua história e também pela força das suas atuações. Zoë Saldaña é a motriz que guia o longa e nos apresenta ao universo e aos personagens que compõem a história. Seja em momentos mais dramáticos ou em arcos musicais, a presença de Zoë é o maior ganho do filme. Além dela, Karla Sofía Gascón, Selena Gomez e Adriana Paz completam a parte mais qualificada de Emilia Pérez. Aqui, notem que falei qualificada e não acertada. Das quatro atrizes, apenas Adriana Paz é realmente mexicana e, no contexto da trama do longa, a falta de protagonismo daqueles que fazem da história o que ela é, faz muita falta e nos sufoca com sotaques americanizados de um espanhol que não passa nenhuma veracidade. 


Outro ponto positivo do filme é, de certo modo, a direção de Jacques Audiard quando pensamos no aspecto técnico. O francês consegue aqui fazer algo muito difícil, que é misturar gêneros de uma forma muito criativa e original, o destaque vai para o número musical da inquietante  "El Mal" que traz quase um rap melódico vomitado com ódio pela personagem de Saldaña ao falar sobre a hipocrisia de políticos presentes em um evento de caridade em prol das mulheres. Com essas atrizes inspiradas, especialmente nas cenas dramáticas e musicais, Audiard consegue mostrar bem os conflitos e sofrimentos de suas protagonistas de uma maneira que o público cria empatia com as personagens.

Foto: Divulgação


Porém, a decisão de Jacques Audiard em filmar Emilia Pérez nos estúdios Bry-Sur-Marne, na França, para trabalhar com sua equipe habitual, torna o longa plastificado e pouco natural. Fica óbvio durante as suas 2h10 que nada foi feito no México, colocando o país que teoricamente é o protagonista desta trama para escanteio. Muito além desses estereótipos estéticos que perpetua (com aquele filtro sofrido, que já estamos acostumados a ver a América Latina), vejo no longa uma visão do México que se assemelha a visão que muitos possuem do Brasil e que, mesmo tentando servir de denúncia, o longa, na realidade, reforça um México miserável e dominado pelo tráfico. 


Voltando a falar de Karla Sofía Gascón e da personagem título do filme, não é segredo que a atriz impressiona na atuação. Seja quando demonstra a masculinidade de Manitas ou quando nos apresenta a feminilidade de Emilia, Karla constroi uma personagem complexa e, ao mesmo tempo, impressionante. Porém, todo o arco de redenção e protagonismo de Emilia Pérez é jogado no lixo no decorrer de sua conclusão. Aqui, sem entrar no mérito da questão ética acerca de termos uma ex-chefe do narcotráfico não sendo julgada corretamente por seus crimes, temos mais um torpe clássico falando de LGBTQ+ nas telas quando chegamos ao final da história. 


Do que adianta dar esse protagonismo e colocar especialmente, essa personagem, em sofrimento? Ela não seria merecedora de um final feliz? Onde está a irmandade entre as mulheres que Audiard tanto se gaba durante a trama? Não sei responder a essas questões e decerto não sou a pessoa ideal para tal. Mas a sensação que fica ao final de Emilia Pérez é de que ele é um longa contraditório, que não sustenta sua proposta inicial e enche toda as lacunas da sua trama de estereótipos e de uma visão distorcida que se propõe a ser uma representação latina, mas que, na realidade, não representa o México e nem o povo mexicano. 


Nota: 2.5/5


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