Ridley Scott dirige grandiosa caricatura mais preocupada com símbolos do que com fatos
Foto: Divulgação
Napoleão é um épico de ação que procura representar a ascensão e queda do icônico imperador francês Napoleão Bonaparte (Joaquin Phoenix). Se exibindo numa produção cinematográfica de grande escala orquestrada pelo lendário diretor Ridley Scott, o filme captura a jornada incansável de Bonaparte ao poder através do prisma de seu relacionamento volátil e viciante com Josephine (Vanessa Kirby), mostrando suas táticas militares e políticas, visionárias e fracassadas, que o fizeram conquistar e explorar parte da Europa e da África.
Não sei se foi intencional do diretor – certamente que não – querer lançar um filme sobre um militar político com mania de grandeza, problemas de insegurança e mentalmente instável em meio ao contexto que o continente americano de alto a baixo vem enfrentando, mas o timing é ironicamente certeiro. E dá um alívio ver que Ridley Scott não quis fazer uma homenagem cheia de louvor e glórias deslavadas. É claro que o nome Napoleão conseguiu grandes feitos históricos e muitos deles estão filmados, mas Scott parece se importar bem mais com o personagem do imaginário popular do que com a personalidade documentada.
A representação do filme beira o pastiche, e os melhores momentos inquestionavelmente são quando Joaquin Phoenix liga o f* e interpreta um Napoleão caricato, mas ao mesmo tempo sem extravagâncias (e sem se importar nem com sotaque); e catatônico, mas ao mesmo tempo concentrado e calculista. Não menos competente está Vanessa Kirby que, mesmo tendo uma participação que poderia ter sido mais valorizada, vive uma Josefina que no pouco tempo que aparece consegue ter camadas bem expostas e distintas.
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Já é certo que haverá uma versão do diretor de 4h de duração, e, ao saber disso, fica respondido o porquê de alguns cortes abruptos em momentos que trariam mais profundidade ao desenvolvimento do personagem principal. Porém, apesar disso, o ritmo não é comprometido. Mesmo quando o tom pesa mais para o drama, logo em seguida ele se equilibra com notas de humor, ironia e muita guerra. Porque não se engane, é um drama de guerra com alguns bons minutos de cenas colossais de conflitos muito bem ensaiadas e filmadas da maneira que poucos conseguem igual ao experiente diretor.
O imagético é o principal obstáculo do longa-metragem. A fotografia de Dariusz Wolski, mais uma vez, não consegue trabalhar a pregnância das sombras e o excesso de filtros mata todas a vivacidade das cores que poderia dar uma identidade mais impositiva e marcante ao visual.
O roteiro de David Scarpa não esconde ser uma adaptação. E essa é a grande chave do filme. A releitura, a interpretação e a construção quase mitológica que passa por cima do concreto para consolidar uma figura. Mas ao mesmo tempo que contando um conto aumenta vários pontos, não esquece de colocar no centro de uma lente microscópica que o mito é apenas um homem com questões mal resolvidas de obsessão e poder, e que o herói é um frágil ser humano com obsessões inconsequentes quase que infantis por domínio.
Nota: 4/5
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