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Crítica | O Silêncio das Ostras

  • Foto do escritor: Ana Beatriz Andrade
    Ana Beatriz Andrade
  • 16 de jun.
  • 3 min de leitura

Uma ficção quase documental sobre os crimes ambientais que marcam Minas Gerais.

Imagem: Divulgação
Imagem: Divulgação

A arte e a realidade andam de mãos dadas. Muitos dizem que é necessário o real para que a arte exista e possa reproduzir seus fragmentos; outros defendem que a arte, por si só, não precisa de pré-requisitos. Ela é livre para fazer o que bem entender. No cinema, estamos familiarizados com a reprodução de fatos reais, especialmente com a ascensão do gênero documental nos últimos anos. Mas há também um caminho híbrido: o do longa-metragem ficcional baseado em uma história real. É o caso de O Silêncio das Ostras, que se inspira nos desastres ambientais provocados pelo rompimento das barragens em Minas Gerais.


Dirigido por Marcos Pimentel, “O Silêncio das Ostras” conta a história de uma família em situação de extrema vulnerabilidade em um vilarejo em Minas Gerais. A região é altamente marcada pela atividade mineradora, afetando a paisagem e a vida dos seus moradores. Somos introduzidos à narrativa pela visão de Kaylane (vivida com sensibilidade pelas atrizes  por Lavínia Castelari e Bárbara Colen), da sua infância até a vida adulta. Sempre curiosa e criativa, a personagem tem uma relação particular com os seus entornos, colecionando insetos e prestando atenção nos detalhes e modificações da natureza.


O filme é ocre, monocromático e bastante silencioso. Por mais que ele possua uma linearidade temporal dos seus acontecimentos, a sensação é de estagnação – um verdadeiro vácuo. Não há uma noção de mudança além do domínio das mineradoras naquela região, e o filme faz questão de enfatizar isso, especialmente por meio de seus enquadramentos e da sua edição de som.


Imagem: Divulgação
Imagem: Divulgação

A fotografia de Petrus Cariry não economiza em trazer sensação de paralisia naquele cenário hostil. Ao lado da direção de Marcos Pimentel, a câmera é estática, porém firme em seu conteúdo, seja na experimentação de Kaylane sobre a vida, ou na lama se formando. O lugar, por si só, já encontra substância para contar uma história. Talvez o casamento entre imagem e som seja a melhor combinação de O Silêncio das Ostras. O som ambiente acaba sendo a melhor trilha sonora, aliando vento, moinho e a presença invisível, mas sempre onipresente, da mineradora.


A trajetória de Kaylane, embora ela seja nossos olhos e ouvidos, é marcada por muita subjetividade, e talvez isso tenha sido uma escolha proposital. Um dos sentimentos que o filme provoca é pensar como seria a sua vida caso a mineração não fosse tão incisiva e inescapável sobre os moradores de suas adjacências. A falsa sensação de gratidão a uma empresa que oferece emprego e renda paira no ar, mas é confrontada com força quando cenas reais dos crimes ambientais de Bento Rodrigues e Brumadinho são inseridas na narrativa.


Fiel ao título, O Silêncio das Ostras é, de fato, silencioso e difícil de engolir. Não é um filme para se ver muitas vezes. Com um tom ficcional impregnado de realidade documental, ele provoca indignação diante do que aconteceu, e do que ainda acontece. A rota da lama é dolorosa, e talvez retratos tão duros como este sejam essenciais para que a arte cumpra sua velha missão: nos fazer olhar, mais uma vez, para algo que deveria estar sendo acompanhado nas pautas dos jornais todos os dias. Mas que seja uma experiência fácil ou agradável, isso definitivamente não é – ela é lenta e massante. 


Nota: 3/5


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