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Crítica | A Batalha da Rua Maria Antônia

  • Foto do escritor: Vinicius Oliveira
    Vinicius Oliveira
  • 27 de mar.
  • 3 min de leitura

Supervalorização da técnica e temática relevante não escondem as nítidas deficiências do filme.


Divulgação


Em meio ao sucesso da minissérie Adolescência, da Netflix, tenho visto uma exaltação daquele que é certamente seu elemento mais distinto: o fato dos seus quatro episódios ocorrerem em plano-sequência, técnica onde vemos um único plano (ou onde os cortes entre os planos são ocultos pela montagem) de forma a passar uma ideia de continuidade. É um feito que sempre impressiona, como podemos ver em filmes como Filhos da Esperança ou até aqueles em um único plano-sequência, como Birdman. Afinal de contas, é uma técnica que aponta para o esforço hercúleo que envolve sua realização, conferindo um ar “elevado” à obra em questão. No entanto, é preciso sempre se perguntar: a que serve tal técnica? O que ela nos comunica nessa obra fílmica?


Trago essa reflexão porque hoje estreia A Batalha da Rua Maria Antônia, filme dirigido por Vera Egito e que conta a história do embate entre estudantes da USP e da Mackenzie durante plena ditadura, em 1968. O longa é composto por 21 planos-sequências que relatam a escalada do conflito entre os dois grupos em face das votações para a UNE, com o grupo da USP (foco do filme) representando a resistência estudantil contra a ditadura, que era nítida apoiadora da Mackenzie à época. Vera filma os planos-sequência com uma câmera de mão que empresta um ar documental e de cinema verité aos eventos, o que é reforçado pela razão de aspecto em 4:3 e a fotografia em preto-e-branco, enquanto pincela as vidas pessoais de alguns dos personagens.


O uso da palavra “pincela” não é à toa. Em apenas 84 minutos, é de se esperar que não haja um grande desenvolvimento desses personagens para além do básico, mas a despeito de todos os recursos técnicos e estéticos conferidos ao filme (com nítidos acenos a movimentos como a Nouvelle Vague e suas diretrizes políticas mais radicais), muito dele é gasto focando justamente nesses dramas pessoais dos personagens, o que não seria um problema em si, não fosse o fato de que sacrifica e esvazia muito da tensão que se pretende alcançar através dessa narrativa em tempo real e a intensificação do conflito, ainda que sintamos o impacto em determinados planos-sequência onde a violência e a tensão do momento retratado nos atingem eficazmente.


Não ajuda o fato de que, mesmo com todo esse apelo com que o filme quer nos atrair através da imagem, o seu texto cai em lugares-comuns de obras ambientadas na ditadura que chega a ser vergonhoso. As atuações em gerais mecânicas do elenco prejudicam ainda mais a entrega do texto, de modo que, ainda que o objetivo geral do longa seja nos fazer simpatizar pelos estudantes da USP, há pouco pelo que simpatizar aqui, já que parte deles são repetições de estereótipos já batidos (a estudante isenta que se envolve com a luta política, o líder carismático e problemático, a adulta ingênua, etc.).

Divulgação


Chega ser curioso que numa obra que se preza tanto a uma estética mais documental e realista, sua melhor cena seja aquela que foge mais a tal estética, que é aquela em que duas personagens fazem sexo. A maneira como Vera filma ambos os corpos, depois posicionando-os em reflexos no espelho que atinge ares quase surrealistas, é um desvio tão gritante da maneira como a encenação vinha sendo construída que poderia ser um ponto baixo do filme, mas acaba sendo uma de suas melhores cenas e talvez uma das poucas onde a ênfase nas vidas pessoais desses personagens se justifique na narrativa.


De alguma maneira, é poético que tenha assistido A Batalha da Rua Maria Antônia num dia em que presenciei embate entre alunos da UNICAMP que lutavam em favor das cotas trans na universidade e militantes do MBL que vieram para causar seu típico pânico moral e posar de vítimas. Enquanto estes últimos eram enxotados, vi os alunos chamá-los das mesmas palavras que aqueles da USP de 1968 gritavam para os da Mackenzie e que de nada adiantaram. Se alguma coisa resta do filme, é que ele aponta para a ingenuidade ainda presente na esquerda brasileira, como se bradar “fascistas” e palavras de ordem para reacionários e fachos bastasse. Entretanto, o saldo final é de uma obra presa a essa mesma ingenuidade, inclusive no campo técnico e estético, ao não confiar o suficiente na imagem e diluí-la e esvaziá-la com um texto medíocre.


Nota: 2/5

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