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Foto do escritorFilipe Chaves

Crítica | Assassinato no Fim do Mundo (Minissérie)

Quando Agatha Christie encontra a alta tecnologia

Foto: Divulgação


Todo mundo já está familiarizado com os artifícios da famosa escritora de mistério e como eles são usados em diversas produções, boas ou não. Felizmente aqui, Brit Marling e Zal Batmanglij conseguem contar a história de uma detetive amadora da Geração Z de uma maneira muito instigante, se utilizando bastante da contemporaneidade e trazendo uma identidade própria para a minissérie. Darby Hart (Emma Corrin) é o Poirot da vez, que é também uma hacker, e a trama começa quando a moça e mais oito pessoas são convidadas por um bilionário recluso para participar de um retiro em um local remoto e deslumbrante. Quando um dos convidados é encontrado morto, Darby tenta usar todas as suas habilidades para provar que foi um assassinato, enfrentando uma maré de interesses conflitantes, e antes que o assassino tire outra vida. Uma sinopse um pouco adaptada da que está disponível no Star+, para evitar spoilers.


A narrativa não-linear se alterna entre o presente e o passado de Darby, enquanto ela investigava um caso com Bill (Harris Dickinson), seu parceiro de trabalho e amor da sua vida, mesmo que naquele momento ela ainda não saiba disso. Os flashbacks importam mais pelo desenvolvimento dos personagens como indivíduos e como casal do que pelos crimes que estão tentando desvendar ali. As paisagens gélidas da atualidade contrastam perfeitamente com as cores quentes de quando a narrativa se transporta ao passado, e não é à toa que ali Darby e Bill estavam em seus momentos mais apaixonados, enquanto as cores frias predominam no presente, assim como a solidão e o luto que Darby sente, já que a pessoa que morreu é alguém importante para a moça. Ela e Bill não estão mais juntos e aos poucos vamos entendendo o porquê, mas essa conexão com a belíssima fotografia é crucial para acompanhar essa história de amor e mistério, que ainda é embalada por uma trilha sonora incrível.


A minissérie possui um grande elenco, além de Corrin e Dickinson e sua intensa química, ainda estrelam Clive Owen, como o bilionário Andy Ronson, a própria Brit Marling, como Lee Andersen, uma grande hacker e esposa de Andy, e claro, minha querida Alice Braga, em um ótimo papel que não ressalta estereótipos brasileiros e apenas exalta o seu talento. Além deles ainda temos mais seis convidados e os funcionários do retiro e nem todos ganham tantos holofotes, o que é justificável, já que não é o ponto da produção. No entanto, o destaque maior vai para Corrin e sua Darby, que é uma baita protagonista. Tímida, mas não é introvertida, ela tem uma inquietude desesperada para descobrir a verdade, isso enquanto lida com sentimentos conflitantes, o que faz com que ela meta os pés pelas mãos vez ou outra, e isso só a torna mais humana e é onde Corrin brilha com sua delicadeza e sutileza, e quando a cena pede uma exaltação maior, jamais foge do tom, mostrando seu profissionalismo de primeira.

Foto: Divulgação


São sete episódios no total e eles são o suficiente para que a trama não faça rodeios desnecessários. A exibição semanal é sempre meu modelo favorito e os excelentes ganchos deixados a cada fim de capítulo me deixavam ainda mais ansioso para o que viria a seguir. A princípio, parece que no panorama geral há algo maior que interliga os assassinatos e critica a dependência da tecnologia, do capitalismo e como os super ricos se beneficiam disso. De fato, o roteiro faz isso, mas no fim é o lado humano que importa. Mesmo que as revelações não sejam exatamente surpreendentes, elas são cabíveis e honestas diante de todo o contexto que foi construído até então. No último episódio, nada mais Agatha Christie do que reunir todos os personagens que sobraram em um único ambiente, onde eles são confrontados por seus segredos, até que o assassino seja revelado. O texto da cena é expositivo e é necessário muito equilíbrio entre atuações e direção para que a linha tênue do cafona não seja ultrapassada – como foi, em uma sequência que envolve uma destruição de um aparato tecnológico, devo dizer –.


O saldo final é extremamente positivo e eu gosto como a minissérie traz os elementos clássicos de um “quem matou?” e mistura com toda essa modernidade que vivemos hoje, mesmo que nós, reles mortais, não tenhamos acesso a uma Inteligência Artificial como Ray, por exemplo. Não sei se foi o trauma de ‘The OA’ ter sido cancelada sem um devido final, mas a dupla Brit Marling e Zal Batmanglij não quiseram deixar nem um i sem pingo dessa vez. Pessoalmente, eu preferiria que algumas coisas tivessem sido deixadas em aberto, mas isso não é um grande incômodo e em nada atrapalha a experiência de assistir a esta minissérie que chegou nos 45 do segundo tempo e ainda conseguiu ser uma das melhores do ano.


Nota: 4,5/5

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