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  • Foto do escritorVinicius Oliveira

Crítica | Crescendo Juntas

Sobre Deus e a universalidade do amadurecimento feminino

Foto: Divulgação


Acredito que poucos gêneros saibam tão bem transpor barreiras culturais, linguísticas e nacionais como o coming-of-age. É como se certos aspectos da vida – especialmente na infância e adolescência – fossem tão universais que é facilmente possível identificá-los mesmo em meio às especificidades e particularidades das nossas vivências. Dores, alegrias e mudanças com as quais nos conectamos aos personagens em tela, não importa quantos anos já tenham se passado.


Crescendo Juntas olha pra essa universalidade dentro do âmbito feminino e a alia à figura do divino. Não que este seja um filme religioso – ele não é –, mas o Deus com quem a protagonista Margaret Simon (Abby Ryder Fortson) conversa é um veículo de escape para suas angústias, incertezas, alegrias e provações, com as quais tantas meninas e mulheres podem se identificar.


A diretora Kelly Fremon Craig não é uma estranha ao coming-of-age, tendo dirigido um dos filmes mais bem-recebidos do gênero da década passada, Quase 18 (2016). Entretanto, aqui ela supera sua obra anterior ao nos fazer empatizar por cada situação vivida por Margaret, por mais simples (e ao mesmo tempo complexa) que pareça. Seja quando ela fala a Deus do desejo de mensturar pela primeira vez e seus peitos cresçam, ou quando tenta entender como seus avós maternos puderam rejeitar sua mãe Barbara (Rachel McAdams) por se casar com seu pai Herb (Benny Safdie), um homem judeu, há um interesse genuíno de Craig em filmar a obra e nos dar um olhar que confere a devida dimensão dos dilemas por quais a personagem passa e os aceitemos e até os sintamos.

Foto: Divulgação


Claro, esse olhar só funciona antes de tudo porque Abby Ryder Fortson entrega uma das performances mais cativantes que vi dentro do gênero. A maneira como ela é filmada, a sinceridade que confere a cada detalhe de Margaret, nos permite que criamos conexão com a protagonista, que rapidamente se tornou uma das minhas favoritas entre os filmes coming-of-age. Aliás, todo o elenco é um espetáculo, a começar pelas demais atrizes mirins que interpretam as novas amigas de Margaret (Elle Graham, Amari Alexis Price e Katherine Kupferer), todas potenciais talentos para ficar de olho nos próximos anos.


No entanto, o grande destaque do filme junto a Fortson é Rachel McAdams como Barbara. A relação dela com a filha é pautada por uma beleza e ternura tocantes, ao passo em que o filme nos dá vislumbres dos seus dramas pessoais (é impossível não se emocionar com a cena em que ela finalmente explica a Margaret porque a menina nunca conheceu seus avós maternos). McAdams, uma atriz por quem sempre nutri enorme admiração nos mais diversos gêneros que explorou, entrega uma sinceridade e naturalidade que engrandecem sua personagem, e é um frescor que o filme saiba lhe entregar momentos próprios que não a definam apenas em torno da maternidade.


Além disso, a presença de Kathy Bates como Sylvia, avó paterna de Margaret, faz com que o título nacional do filme ganhe completo sentido, mesmo destoando tanto do original. Não que ela chegue a receber o mesmo tempo de Fortson e McAdams, mas o roteiro (também assinado por Craig) consegue equilibrar as diferenças e semelhanças das vivências dessas três mulheres em diferentes fases da vida. Nesse sentido, é até possível perdoar o pouco espaço que Safdie tem no filme, visto que seu olhar é muito mais dirigido ao universo feminino e como ele é constituído dessa já citada universalidade (inclusive nas performances às quais as personagens precisam se submeter em nome da aceitação dos meninos/homens e também das outras meninas/mulheres), mas também dos detalhes que humanizam e singularizam essas meninas e mulheres.


Dada a ressonância e atemporalidade dos temas que costuma trabalhar, o coming-of-age é o tipo de gênero cuja receita do bolo é fácil de se conhecer, já que em time que está ganhando não se mexe. Mas, ainda que não reinvente a roda (até por ser baseado em um dos livros pivotais do gênero), Crescendo Juntas é um dos melhores exemplares dos últimos anos, graças a essa condução sensível e honesta de Craig que se reflete no cuidado dado às personagens e às interpretações do elenco. Você pode até não se identificar com o drama da primeira menstruação ou de uma crise de fé, mas isso não é impeditivo para se apaixonar por esse filme.


Nota: 4/5


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