Análise | The Last of Us 2x02 (“Through the Valley”): A colheita
- Filipe Chaves
- 21 de abr.
- 3 min de leitura
O peso das nossas ações e o ciclo infinito da violência de um mundo que acabou.

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(CONTÉM SPOILERS DO EPISÓDIO)
“Cada um colhe o que planta”, “olho por olho”, “tudo que vai, volta”, “a conta chega” e eu poderia citar tantas outras frases que remetem ao que aconteceu neste devastador episódio, que já entra para a História da televisão, goste dele ou não. Toda a construção da tensão que dá continuidade aos ganchos deixados pela semana anterior é ótima. O dia começa normal, com mais uma patrulha, e agora Jesse é o companheiro de Ellie, pois Dina já partiu com Joel. Uma Ellie bem mais amena deixa subentendido que começou a fazer as pazes com Joel, uma vez que queria ir com ele na patrulha. “Eu sou eu e o Joel é o Joel, e nada vai mudar isso”. Até que muda. A gente sempre acha que vai ter mais tempo e ninguém está preparado para perder alguém que ama. Seja Joel, seja Ellie, seja Abby.
Joel perdeu Sara no dia do surto e nunca conseguiu se recuperar, até que 20 anos depois conhece essa garota que seria apenas uma “carga”. Se apega a ela e a série constrói brilhantemente sua relação com Ellie. Ele não estava disposto a perder uma outra filha e para salvá-la dizimou 19 outras vidas naquele hospital. Uma delas era o pai de Abby, que procurou Joel por cinco anos até que o encontrou. Quando ela sai em busca de algum patrulheiro de Jackson para dar seguimento ao seu plano, é perseguida por uma horda e acaba tendo a ajuda do próprio Joel para escapar. Enquanto fogem, ela sugere que eles precisam ir até o chalé onde está sua equipe já que está mais próximo e eles poderiam ajudar, quando os infectados são “chamados” à Jackson e atacam o local com toda força. Tommy e parte da população lutam para defender a comunidade em cenas de batalha que lembram Game of Thrones. Joel é atraído para a armadilha de Abby e eu fiquei temeroso que o episódio tivesse muita informação com estes dois eventos, mas a direção de Mark Mylod soube usar da grandiosidade nas batalhas e do intimismo no confronto entre Abby e Joel. São dois momentos cruciais da série, onde o senso de comunidade que nos foi mostrado no episódio anterior de Jackson é testado ao máximo e um onde vemos o ciclo de violência se perpetuar em um mundo de extremos.

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Abby expõe toda a sua dor e seu ódio; ela quer ver Joel sofrer pelo que foi lhe foi tirado. Ela saboreia cada momento da vingança ali e tudo que ela esperou por cinco anos finalmente chegou. Kaitlyn Dever está simplesmente brilhante em cena, na postura, na voz, no olhar, e é uma combustão de sentimentos que ela exala ali, enquanto dita suas motivações. Ela precisa que Joel saiba o que ela perdeu e porqu está fazendo aquilo. Ainda que seja compreensível, não faz ser menos doloroso. Conhecemos Joel por mais tempo, é com ele que temos uma conexão emocional e vê-lo partir não é fácil de maneira alguma. É chocante e é impactante. Há algum tempo já vemos protagonistas morrerem na televisão, mas ainda assim sempre esperamos o contrário e a série brinca com nossas expectativas. Porém, The Last of Us não está interessada em facilidade e sim discutir dilemas morais e éticos em um mundo que estas palavras são apenas isso: palavras, mesmo que finjam que não. A única lei é sobreviver e defender os seus.
Quando falo em quebra de expectativas, posso citar como exemplo torcer para que Ellie chegue a tempo de salvar Joel, mesmo que haja uma desvantagem numérica. Mas se segue a lógica, e a única coisa que ela vê é seu pai – sim, isso mesmo – em seus momentos finais. Pedro Pascal já demostrou ser multifacetado e seu olhar quando percebe que não tem mais volta é de quebrar qualquer um. Só não é pior quando Ellie vê Abby dar o golpe final em Joel e uma Bella Ramsey desesperada e impotente faz um trabalho magistral. Quando ela pede para ele levantar e ele ainda faz um pequeno esforço, é simplesmente devastador. Joel, ao dar uma nova chance de vida à Ellie, acabou com a de Abby. São dois pesos e duas medidas, mas não vou ser hipócrita em dizer que não estou com raiva de Abby. Eu entendo o porquê, mas não tem como não se entristecer pela perda gigante de Joel. É quase inacreditável, mas é cíclico, e agora Ellie jura vingança à Abby e ao grupo. Assim seguimos, com o luto, a devastação e a violência que nunca cessa. Para além do espetáculo visual, é como lida com a complexidade humana que The Last of Us brilha.
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