top of page
Background.png
capa-cabeçalho-marco2025.png

Crítica | Carême – O Rebelde da Culinária (1ª temporada)

  • Foto do escritor: Vinicius Oliveira
    Vinicius Oliveira
  • 11 de abr.
  • 4 min de leitura

Atualizado: há 6 dias

Culinária, intrigas e sedução marcam a nova ficção histórica do AppleTV+.

Divulgação


O sucesso de Game of Thrones na década passada não apenas impactou o gênero da fantasia na TV e no streaming, mas também o da ficção histórica. As inspirações medievais da série e suas intrigas políticas (tão, senão mais aclamadas que seus elementos fantásticos) inspiraram um filão de obras que, mesmo se passando em nosso mundo nos mais diversos períodos do passado, usavam e abusavam de elementos mais adultos – em especial o sexo e a violência – para narrar as disputas de poder nas mais diversas esferas da sociedade.


É na esteira de um certo ressurgimento dessas séries que Carême – O Rebelde da Culinária, nova produção francesa do AppleTV+ a ser lançada em 30/04, vem para disputar seu próprio espaço. Ambientada durante os primeiros anos do regime de Napoleão no início do século XIX, a série acompanha seu protagonista, Marie-Antoine Carême (Benjamin Voisin), um jovem, talentoso e ambicioso chef que trabalha com seu pai adotivo e, após este ser preso injustamente pela polícia napoleônica, recorre ao misterioso nobre e ex-clérigo Charles Maurice de Talleyrand (Jérémie Renier), que promete ajudá-lo e até mesmo o emprega, mas em troca de seus esforços de espionagem em meio ao cenário turbulento que se desenha para as forças napoleônicas.


Embora Carême e boa parte das figuras retratadas na série realmente tenham existido (a série é baseada no livro Cooking for Kings: The Life of Antonin Carême, The First Celebrity Chef, do historiador Ian Kelly), inegavelmente são tomadas liberdades criativas que propulsionam a história, em especial esse lado “espião” do protagonista. Lançado de paraquedas nesse cenário de intrigas e disputas políticas, ele se vê forçado a lançar de suas maiores armas para sobreviver – suas habilidades geniais com a culinária e também seu charme e sedução. A série adota, ao menos em sua primeira metade, uma estrutura mais episódica, quase procedural, onde Carême precisa ajudar Talleyrand com algum problema relacionado ao círculo de Napoleão ou ao próprio (que, curiosamente, quase não aparece, e quando aparece é apenas em planos-detalhe que ocultam seu rosto). Na segunda metade, a coroação de Napoleão se torna o pano de fundo no qual a trama se desenrola com mais segurança, sem o ritmo mais apressado que ameaça atropelar os primeiros episódios.


Admito, porém, que a faceta “espiã” de Carême é o aspecto menos interessante da série, mesmo que gere bons entretenimentos com os jogos de interesse e mudanças de lealdade. É só que não há nada de muito novo ou até mesmo inspirado aqui, o que se estende até mesmo às cenas de sexo, filmadas com pouco tesão, mesmo que a série insista que seja uma das armas mais perigosas e eficazes da história da política. Ao menos essa parte da série ajuda a dar o devido destaque a Talleyrand, que nas mãos de Renier se converte no personagem mais intrigante e interessante da temporada, com suas motivações dúbias (supostamente em nome da França, mas até que ponto tais interesses não são apenas os seus? É possível confiar num homem que trocou tantas vezes de lado durante a Revolução Francesa?) e a relação que constrói com o protagonista, talvez o verdadeiro coração da temporada.


É justamente ao apostar no tratamento de Carême pelo que ele realmente foi conhecido – o primeiro chef celebridade da história – que a série cresce e se distingue em sua abordagem. Já no primeiro episódio o vemos criar um prato tão original e criativo que consegue apaziguar as tensões entre Napoleão e o embaixador inglês, e cada vez que temos o enfoque em seus pratos e criações, ou em sua personalidade turbulenta dentro da cozinha, vê-se a série mais inspirada. Chega a ser curioso que a figura de Carême é apresentada como anacrônica e à frente do seu tempo antes mesmo de o vermos em ação, como atesta o figurino do personagem e até mesmo o andar que Voisin imprime ao personagem.  

Divulgação


Outro ponto positivo da série é a maneira como ela insere naturalmente uma noção de uma França mais diversa naquele período do que a historiografia oficial, especialmente através de suas duas protagonistas femininas, Henriette (Lyna Khoudri, uma mulher árabe) e Agathe (Alice da Luz, uma mulher negra). Mesmo que o texto ainda por vezes resvale em algumas obviedades para sustentar esse discurso mais representativo (ou aluda a um potencial triângulo amoroso entre Câmere e as duas personagens), no geral a inserção desses elementos se dá de maneira bem orgânica à trama e à ambientação.


Ainda que não sem suas imperfeições, Carême se revela uma grata surpresa que permite conhecer um personagem, o qual particularmente não fazia ideia da sua relevância para sua culinária mundial nem seu grau de envolvimento na política francesa da época – independentemente se ele foi mesmo um espião ou “só” um chef muito talentoso. Com um final que deixa ganchos para se explorar os conflitos destes personagens em meio ao cenário das guerras napoleônicas, só posso esperar que ela alie de maneira cada vez mais acertada essa distinta dinâmica entre culinária, sexo, poder e intrigas políticas.


Nota: 3.5/5

Comments


bottom of page