Crítica | LAR
- Ana Beatriz Andrade

- 14 de nov.
- 2 min de leitura
Leandro Wenceslau transforma o cotidiano de famílias LGBTQIAPN+ em um gesto de afeto e reconhecimento.

Uma das máximas de Eduardo Coutinho é que o documentário é um território de incertezas, mas isso é o que o torna belo. Ligar uma câmera e registrar o cotidiano pode parecer simples, até previsível. Ainda assim, nada disso diminui a essência do encontro entre quem filma e quem é filmado. É nesse ponto que começo a falar de “LAR”, primeiro longa-metragem documental do cineasta mineiro Leandro Wenceslau.
“LAR” acompanha três famílias LGBTQIAPN+ em suas rotinas, maneirismos, hábitos e, acima de tudo, em seus afetos. Paralelamente, o filme assume sua condição documental ao trazer a voz do próprio diretor, que compartilha memórias, revisita experiências pessoais e reflete sobre suas próprias noções de vínculo e família.
Entre as cenas íntimas das famílias e a perspectiva autobiográfica de Wenceslau, o trabalho convida o público a traçar paralelos entre o olhar do diretor e seus desejos de construir uma família. A partir daí emergem as complexidades de criar uma criança sendo LGBTQIAPN+ em uma sociedade ainda marcada pela heteronormatividade: os desafios na escola, as barreiras jurídicas e burocráticas de uma adoção – que ainda perpassam por questões raciais –, além das preocupações triviais de todo pai ou mãe com o bem estar dos seus.
Embora retrate as dificuldades e receios dessas famílias diante do preconceito estrutural, o longa transita entre esses temas com sensibilidade. Cada núcleo familiar tem seus jeitos, dinâmicas e particularidades, o que dá ritmo à primeira metade do longa. Talvez o único incômodo esteja na constante alternância entre as imagens documentais e os monólogos do diretor; uma escolha intencional, mas que pode gerar uma estagnação da narrativa.

Em muitos momentos, o filme se apoia nas cenas mais corriqueiras possíveis, e é justamente isso que o torna especial. Há um evidente cuidado na curadoria das imagens. Entre um “aproveita que você está em pé e busca uma água pra mim” e um “a vó faz uma broa com goiabada, então eu prefiro a broa da vó”, a produção reconhece a presença da câmera, mas nada ali escapa à normalidade. É um filme familiar que não tenta ser outra coisa.
O documentário é cotidiano em sua forma mais pura e reconhece que o desafio também faz parte do trivial. A atmosfera narrativa é calma, sem grandes sobressaltos, o que contribui mais do que atrapalha. O corriqueiro, aqui, aparece como parte legítima do real.
No fim, Wenceslau entrega um documentário sensível, leve em textura e ritmo, que consolida uma ideia muito clara: um lar é feito de acolhimento, de presença e de carinho, longe de qualquer ideia pré estabelecida socialmente.
“LAR” estreia no dia 13 de novembro nos cinemas de Belo Horizonte, Salvador, São Paulo e Vitória, com distribuição da Embaúba Filmes.
Nota: 3,5/5





