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Crítica | O Último Azul

  • Foto do escritor: Isadora Granato
    Isadora Granato
  • há 6 dias
  • 2 min de leitura

A desmistificação do envelhecimento e a luta pela autonomia na terceira idade.


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Divulgação


A autonomia e resistência são os temas centrais de O Último Azul, o novo longa de Daniel Mascaro, que conquistou o Grande Prêmio do Júri (Urso de Prata) no Festival de Berlim 2025 e dois outros prêmios paralelos — o Júri Ecumênico e o prêmio do público do Berliner Morgenpost. O filme mostra com sensibilidade temas como etarismo, envelhecimento e resistência.


O Último Azul se passa em um Brasil distópico onde os idosos são recompensados por suas contribuições à sociedade. A recompensa? Uma intervenção brega na porta de casa e uma passagem só de ida para A Colônia, um espaço de moradia apenas para idosos. É nesse pano de fundo que nos apresentam Tereza, uma senhora que se recusa a ser compulsoriamente aposentada sem realizar o próprio sonho: voar de avião.


Ao assistir o filme, por diversas vezes lembrei da minha avó que se recusa a ser invisibilizada na sociedade. Dona Sônia, minha avó, assim como Tereza, mesmo depois dos 70 anos continua andando sozinha, fazendo compras, passeando, viajando e vivendo, coisa que parece ofensiva para a sociedade do filme. Denise Weinberg é muito sutil ao mostrar que o problema de Tereza não é envelhecer ou ser cuidada por estar idosa, e sim com a invalidez que querem empregar nela por isso. As interações dela com os personagens de Rodrigo Santoro e Adanilo demonstram que a conexão e o carinho são possíveis sem as máscaras intervencionistas.


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Além disso, Mascaro traz uma leitura gentil de como a terceira idade não torna o cidadão em terceira classe. O mérito do filme é mostrar como o envelhecimento não é ruína, mas sim mais uma etapa da vida que merece ser vivida. É estar ativo, no pensamento, no desejo, é uma forma profunda de recusa à irrelevância. Tereza não deseja morrer; ela busca um último ato de liberdade. É uma ode à autonomia, à escolha e à dignidade, em meio a um sistema que tende a reduzir o idoso a estatística.


Visualmente o filme é aconchegante. Gravado no clássico 4:3, cada plano parece estudar o tempo — o silêncio, a vida acumulada nas rugas, o rio como órbita de memória. A sensibilização não está na tragédia, mas na constatação de que a dignidade humana não pode ser medida em produtividade.


O Último Azul é uma metáfora de nosso Brasil: um pouco místico, terno e inquietante. Ele nos faz perguntar: até que ponto uma sociedade é justa se ignora quem já viveu a maior parte da vida? Tereza propõe uma resposta: um último passeio, uma viagem simbólica que, mesmo por dias, devolve a ela — e a nós — um pouco da humanidade que insistimos em perder.


Nota: 4/5


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