Atriz e ator conversaram com o Oxente, Pipoca? a respeito do longa de Pedro Freire
Foto: Divulgação
Estreou no dia 31/10 Malu, o longa-metragem de estreia de Pedro Freire. Parcialmente inspirado na vida de sua mãe Malu Rocha, o filme segue a personagem de mesmo nome (Yara de Novaes), que, no Rio de Janeiro dos anos 1990, luta para conciliar as memórias do passado como atriz de teatro durante a ditadura com a relação tempestuosa e complexa com a mãe Lili (Juliana Carneiro da Cunha) e a filha Joana (Carol Duarte).
Em entrevista para o Oxente, Pipoca?, Carol Duarte e Átila Bee (que vive o personagem Tibira, melhor amigo de Malu) falaram a respeito do processo de produção do filme e de composição de seus personagens, bem como das temáticas discutidas. Questionada sobre se Joana seria uma espécie de “alter-ego” do próprio Pedro, dados os elementos biográficos do filme, Carol responde que na vida real o diretor também tem uma irmã, de modo que sua personagem teria um pouco dos dois. A atriz também destaca o processo intenso de gravação — três semanas de preparação no set e outras três de ensaio —, de modo que a construção dos personagens foi feita de maneira coletiva, especialmente pelo fato do próprio Pedro também trabalhar como preparador de elenco.
Sobre a relação de sua personagem com Malu e Lili, Carol exalta a maneira pela qual Pedro pensou nas contradições e complexidades que cercam essas mulheres. “Malu é essa mulher mais expansiva, e Joana é mais silenciosa, observa e escuta mais. Acho que uma coisa que me marca muito é que há uma briga entre Malu e dona Lili que chega a ser física, e depois quando a Malu confronta a Joana com uma pergunta horrorosa (‘você está comendo seu pai?’), ao invés da Joana bater nela ela se autoagride, bate na própria cabeça, então aí vai se revelando todo um trauma que vai passando de geração para geração”, diz ela.
Já Átila comentou a respeito da inserção de Tibira, um homem negro e gay, numa trama que é marcada pelas ausências de figuras masculinas e também dos traumas que estes geraram nas protagonistas femininas. O ator fala de um “protagonismo ausente” desses homens, enquanto a figura de Tibira é um oposto: alguém que busca mudar o ambiente ao seu redor, em especial com as três mulheres, se destacando por ser tão bem-resolvido quanto à sua sexualidade e aspirações. Ele destaca um momento que teve durante a exibição do filme em Juiz de Fora, onde foi questionado pela saída aparentemente abrupta de seu personagem do filme, após uma situação envolvendo Lili e Malu: “a gente precisa entender também que ter coragem e não ser covarde também é um ato importante. É uma coragem a gente precisar renunciar, precisar sair de cena muitas vezes, e eu acho que ele tem essa compreensão, tem um momento que não dá mais. Eu percebo que o personagem cumpre mesmo a bonita trajetória dele, está ali e sabe se retirar no momento adequado”.
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Por fim, tanto Carol quanto Átila comentaram a respeito de como Malu, mesmo se passando nos anos 1990, pode refletir uma aparente despolitização das gerações mais contemporâneas, em especial com o advento das redes sociais. Carol reforça a problemática da anistia feita durante a ditadura e seu caráter permanente, indicando que isso afetou não apenas a geração de Joana, mas as seguintes. “Essa ameaça militar permanece porque a gente não responsabiliza quem fez; se um homem que levantou no meio do parlamento e bradou Ustra fosse preso, a gente não teria vivido o que viveu”, diz ela.
A atriz destaca também as lutas de Joana, especialmente no contexto em que o filme se passa, e como elas se conectam ao Brasil contemporâneo. “Eu não sei se ela não está nem aí para a questão política, eu acho que eles destruíram o cenário cultural e só no final da década de 90 que a coisa começou a ser retomada a duras penas. Destruir é muito fácil, e reconstruir é difícil. (...) E ao final tem aquela última pergunta de Malu: ‘para onde a gente tá indo?’, e aí a gente vê esse país de agora totalmente assumido, pessoas que saíram dos bueiros com discursos muito postos e fortalecidos. E a gente fica pensando nesse presente, e sabe muito bem para onde está indo”.
Já Átila reforça a atualidade dos panoramas e discussões de Malu, o que o leva a pensar que o país parece estar andando em círculos e na necessidade de se quebrar esses círculos. “A gente fica até cansado de pensar o que pode fazer, temos pouco tempo diante de ameaças tão iminentes. É muito triste, parece um discurso bastante pessimista, mas eu acho que essa pergunta final [‘para onde a gente tá indo?’] não pode sair nunca da nossa mente, e com base nisso a gente precisa agir e pensar em ações”, diz o ator.
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