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Crítica | Better Man - A História de Robbie Williams

Foto do escritor: Vinicius OliveiraVinicius Oliveira

Irreverente e autoconsciente (até certo ponto), biografia de Robbie Williams se distingue em meio à mesmice atual do gênero.

Divulgação


Talvez seja difícil para nós, brasileiros, mensurar o tamanho da popularidade de Robbie Williams no Reino Unido (embora você provavelmente conheça uma ou outra música dele, como Angels ou Sexed Up). Mas basta dizer que ele emplacou sete singles no topo das paradas britânicas, 13 dos seus 14 álbuns estrearam em 1º por lá, seis desses álbuns estão entre os mais vendidos da história do país e ao longo de sua carreira foram 18 prêmios Brit Awards. Considerando o impacto de sua trajetória e seus altos e baixos — com direito a problemas conjugais, familiares e com drogas —, a vida e carreira de Williams é a receita certa para o atual (e já saturado) modelo de cinebiografias que superabundam a cada temporada de premiações.


Que curioso, portanto, que Better Man seja, sob certos aspectos, uma cinebiografia nada convencional. O primeiro e mais óbvio motivo é aquele que já estampa qualquer foto ou pôster de divulgação do filme: ao invés de aparecer como um ser humano, Robbie Williams é transformado em um chimpanzé de CGI antropomorfizado, dublado sobretudo por ele próprio (que também atua como narrador) e Jonno Davies (que também fornece a captura de movimentos). A decisão incomum pode causar certo estranhamento de início, mas não demora a nos habituarmos a essa figura símia a. Além do mais, transformar Williams em um chimpanzé acaba fazendo sentido justamente pelas vezes em que vemos o artista ser comparado a um animal, seja pela família, pelos colegas, imprensa e tantos mais, apelando à ideia de desumanização com a qual muitos popstar são tratados.


Mais do que essa curiosa decisão, porém, o que realmente distingue Better Man da seara de cinebiografias “oscarizáveis” é a irreverência com a qual Williams trata sua própria história. Ao menos em sua primeira hora, o filme se comporta como uma sátira musical, abordando com autoconsciência e um pé no exagero, na fantasia e no lúdico a trajetória de ascensão do artista, como evidenciado na performance de Rock DJ, talvez a mais memorável dentre as sequências musicais do filme. Mesmo nunca deixando de seguir de perto a cartilha do gênero — com direito aos problemas paternos, ao empresário malvadão e à descoberta do prazer no luxo e na luxúria —, o filme consegue remodelar essa cartilha à sua própria imagem, entregando algo próprio.


Outro ponto importante é justamente o cuidado da obra em não relativizar ou “passar pano” para as ações erráticas de Williams. Sim, a ausência paterna é apontada como uma grande catalisadora para seu comportamento problemático e de bad boy, mas o filme trata o personagem como o responsável pelos seus próprios erros, longe de se configurar uma biografia chapa branca como tantas que temos visto por aí (alô, Bohemian Rhapsody). Nesse sentido, posiciono o longa como uma espécie de irmão mais novo de Rocketman, onde mesmo com a presença de figuras antagônicas óbvias, nunca havia dúvidas sobre a (ir)responsabilidade de Elton John pelos próprios atos. Aqui, aliás, há um nítido — ainda que óbvio — trabalho de apontar para o senso de autoimagem de Williams, que está constantemente em conflito consigo mesmo, sua necessidade de ser amado e adorado e a incapacidade dessa adoração preencher seu vazio interior.


Divulgação


Infelizmente, quanto mais se aproxima do auge do estrelato do artista e da sua eventual queda, mais Better Man acaba caindo nas armadilhas básicas do gênero. A irreverência e o tom satírico da primeira metade logo dão espaço a uma abordagem mais séria e dramática que, embora não sem seu peso (a montagem da ascensão do personagem e a sequência de Angels são as minhas favoritas do filme, aliás), acabam tirando muito do brilho que o filme tinha a oferecer justamente por não se contentar com um lugar comum. A própria relação dele com o pai, Peter (Steve Pemberton), reflete essa transformação tonal do filme: o final redentor de ambos, regado a lágrimas e à perdão, pode até ter acontecido na vida real, mas não condiz com o próprio tratamento que o longa dá a Peter e aos efeitos da ausência deste sobre Williams, caindo numa abordagem piegas e excessivamente sentimental que faz parecer que estamos vendo uma outra obra daquela das últimas 2h.


Ainda que no fim das contas se transforme exatamente no tipo de filme que tentou não ser, Better Man ainda oferece elementos o suficiente para se distinguir em meio à mesmice de cinebiografias medíocres e previsíveis feitas para ganhar prêmios. É a prova de que um clichê pode ser contado mil vezes e não há problema nisso: é a forma pela qual se conta esse clichê que importa. Nem que essa forma seja ver um chimpanzé de CGI antropomorfizado cumprindo toda a tabela do roteiro de ascensão, queda e ressurgimento de um popstar.


Nota: 3.5/5

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