Crítica | Caos e Destruição
- Vinicius Oliveira
- 28 de abr.
- 3 min de leitura
Mesmo em modo mais contido, Gareth Evans continua a provar porque é um dos melhores diretores em atividade no gênero da ação.

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Apesar da minha ligação com o cinema de ação remeter à infância e adolescência, me vi tendo um certo distanciamento do gênero ao longo dos anos, tanto por me ver imerso em outros gêneros quanto por uma certa percepção de que estes filmes estavam se saturando (especialmente ao copiarem erroneamente o modelo da edição frenética e cheia de cortes da franquia Bourne ou por serem cooptados pelos blockbusters a la Marvel). Esse distanciamento só não foi completo graças a duas franquias: a tetralogia de John Wick e a duologia Operação Invasão, esta comandada pelo galês Gareth Evans e que revelou ao mundo a arte marcial indonésia conhecida como pencak silat e novas estrelas como Iko Uwais e Yayan Ruhian.
Mais de dez anos após o segundo Operação Invasão, Evans retorna ao gênero da ação nos cinemas com Caos e Destruição, longa que vinha sendo gestado lentamente desde 2021 e agora enfim estreou na Netflix. Nele acompanhamos o detetive corrupto Patrick Walker (Tom Hardy), que se vê envolvido na investigação de uma negociação de drogas que deu errado e culminou num massacre, e onde o principal suspeito é Charlie (Justin Cornwell), filho do atual candidato a prefeito Lawrence Beaumont (Forest Whitaker). Disposto a deixar seu passado corrupto para trás de uma vez por todas, Patrick concorda em achar Charlie, mesmo que precise mergulhar cada vez mais no fundo do submundo desta cidade, lutando contra o tempo para proteger o rapaz antes que este seja encontrado por outros policiais corruptos comandados por Vincent (Timothy Oliphant) e pela tríade chinesa.
Na superfície, a premissa de Caos e Destruição é vagamente similar a um sem-número de outras produções de ação, inclusive no próprio catálogo da Netflix, que tem sido um streaming propenso a saturar o gênero de todas as formas possíveis. Essa, aliás, tem sido uma constante crítica aos filmes de ação há um bom tempo, mas Evans faz dessa fraqueza a sua força, ao transformar seu filme num exercício de maneirismo para contar uma história tão batida do seu próprio jeito. Não que o filme se equipare aos dois Operação Invasão – honestamente, não chega nem perto disso –, mas consegue se sobressair em meio ao catálogo saturado da Netflix justamente pela identidade e marca autoral do seu realizador firmemente presente.
É notório, por exemplo, que Evans faça dessa metrópole sem nome onde o longa se passa uma versão noturna e (ainda mais) corrompida da Jakarta de Operação Invasão, apostando em uma artificialidade que constantemente a atenção para si mesma, seja no uso do CGI, na estética um tanto “gamificada” e no constante uso de neón que empresta toques de neo-noir e até faz aceno ao cinema de ação de Hong Kong. Isso, junto ao elemento da máfia chinesa envolvida na trama, mostra que, mesmo que tenha retornado ao Ocidente, o diretor não perdeu de vista as lições e o legado que construiu ao trabalhar no cinema indonésio e asiático.

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Talvez onde o filme realmente peque é que, para um longa de Evans, há menos ação do que o esperado. O diretor constrói um ritmo cadenciado conforme prepara as peças do tabuleiro (ainda que nosso foco se detenha quase exclusivamente em Walker, vivido com Hardy com um suave toque de humor e cinismo), mas a despeito de uma perseguição no começo do filme e outros instantes pontuais, demora para que sejamos envolto pelo caos e destruição propostos no título nacional.
No entanto, quando este vem – em especial em duas sequências específicas, a da boate e a da cabana –, Evans mostra a que veio. Ainda que essas sequências não carreguem muito da fluidez e da finesse daquelas de seus filmes anteriores (acredito eu que porque aqui não há o elemento das artes marciais como parte da mise-en-scène), a brutalidade e violência fazem jus à reputação do diretor, que não se furta a fazer seus personagens usarem qualquer objeto que encontrarem pela frente como arma. Uma cena em particular envolvendo um arpão me fez soltar um grito de êxtase, me fazendo lembrar porque sempre amei filmes de ação.
Ainda que acabe residindo na sombra do que Gareth Evans produziu antes para o gênero – e nem sempre justifique a longa expectativa desses 4 anos desde seu anúncio –, Caos e Destruição consegue em seus momentos mais inspirados mostrar o melhor que a ação tem a oferecer, graças à visão de um diretor que abraça e explora o gênero tem a oferecer, entregando uma violência visual que é gratificante de se assistir. É mais do mesmo? Sim, mas nada como bons clichês trabalhados com autoria e competência.
Nota: 3.5/5