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Crítica | Pssica (Minissérie da Netflix)

  • Foto do escritor: Gabriella Ferreira
    Gabriella Ferreira
  • há 3 dias
  • 2 min de leitura

Entre a beleza e a brutalidade da Amazônia, minissérie expõe o tráfico humano e transforma denúncia social em suspense hipnótico

Imagem: Divulgação
Imagem: Divulgação

A Netflix mergulha mais uma vez no universo do audiovisual brasileiro com Pssica, minissérie baseada no livro homônimo do paraense Edyr Augusto. Ambientada nos rios da Amazônia Atlântica, a produção combina realismo brutal e atmosfera quase mística para retratar uma trama marcada por violência, sobrevivência e destinos cruzados. Sob a direção de Quico Meirelles, filho de Fernando Meirelles (que também trabalha na direção da série), a obra se apoia em personagens complexos e narrativas entrelaçadas, evocando tanto o thriller quanto o drama social. O resultado é uma experiência intensa que provoca desconforto e fascínio na mesma medida.


Divida em quatro episódios, o enredo parte de três protagonistas que representam universos distintos, mas inevitavelmente ligados pela engrenagem da violência: Janalice (Domithila Cattete), vítima de um sequestro cruel; Preá (Lucas Galvino), herdeiro relutante de uma gangue fluvial; e Mariangel (Marleyda Soto), em busca de vingança pela perda da família. Cada arco narrativo é construído de uma forma muito particular, onde cada história se interliga em determinados momentos. 


Um dos aspectos mais marcantes da adaptação é a inserção de trechos do livro em determinadas cenas, especialmente nos momentos de maior tensão ou violência. Quico Meirelles conduz Pssica com um ritmo que alterna entre contemplação e brutalidade. Há momentos em que a câmera repousa sobre o silêncio sufocante dos rios, permitindo que a paisagem carregue uma tensão quase invisível, e, de repente, a narrativa é sacudida por explosões súbitas de violência. Essa cadência não apenas sustenta o suspense, mas também traduz a própria lógica da sobrevivência. 

Imagem: Divulgação
Imagem: Divulgação

A fotografia é um dos pontos altos da minissérie. Ao apostar em tons escuros, contrastes fortes e texturas naturais, ela cria uma atmosfera quase mística, em que a floresta e os rios não são apenas cenários, mas forças vivas que oprimem e condicionam cada escolha dos protagonistas. Essa estética reforça o peso simbólico da “pssica”: a maldição que parece impregnar não só os personagens, mas também a própria terra, como se o ambiente estivesse conspirando contra qualquer possibilidade de redenção.


O grande acerto de Pssica é não romantizar nenhuma das linhas narrativas colocadas para cada protagonista. Cada personagem pode ser, simultaneamente, vítima e algoz, salvador e destruidor. Essa ambiguidade quebra maniqueísmos fáceis e cria um jogo narrativo que instiga o público a repensar continuamente suas percepções sobre quem é o “herói” e quem é o “vilão”. Muito disso perpassa pela atuação do trio protagonista, que é extremamente competente (assim como o elenco da minissérie como um todo). 


Intensa, densa e profundamente inquietante, Pssica reafirma o potencial do audiovisual brasileiro em criar obras que não apenas entretêm, mas também cutucam feridas abertas da realidade social. Ao abordar temas como o tráfico humano e a exploração sexual na Amazônia, a minissérie expõe a engrenagem violenta que atravessa vidas e territórios, transformando denúncia em arte. É uma produção que exige fôlego e disposição do espectador pelos temas fortes que aborda, mas que recompensa com um mergulho na escuridão dos rios amazônicos, onde beleza e violência se confundem, e onde toda esperança parece assombrada pela inevitável sombra de uma maldição.


Nota: 4.5/5


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