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Entrevista | Joe Pimentel fala sobre “Antonio Bandeira - O Poeta das Cores”

  • Foto do escritor: Ávila Oliveira
    Ávila Oliveira
  • 12 de abr.
  • 8 min de leitura

Atualizado: 13 de abr.

Em conversa com o Oxente Pipoca, o diretor tratou de seu documentário a respeito do falecido pintor cearense.

Divulgação


Estreou nos cinemas no último dia 10 de abril o documentário Antonio Bandeira - O Poeta das Cores, que faz uma síntese da vida e obra do pintor cearense pioneiro do abstracionismo no Brasil. Com depoimentos e entrevistas, e conduzido pelo sobrinho de Antonio, Francisco Bandeira, o filme é dirigido por Joe Pimentel, que conversou com exclusividade com o Oxente Pipoca sobre a produção.


Confira a entrevista na íntegra:


Ávila Oliveira (Oxente Pipoca): Vou começar literalmente pelo final, eu vi que nos créditos finais tem “Ideia Original: Francisco Bandeira, Maria Amélia Mamede e Joe Pimentel", mas eu gostaria de saber de quem foi o pontapé inicial para a realização deste documentário. Quem procurou quem com a dita ideia original?


Joe Pimentel: Então, deixa eu te falar, eu conheci o [Francisco] Bandeira na década de 90, eu fui trabalhar no curso de Comunicação Social da UFC para montar um laboratório de vídeo lá. E o Bandeira trabalhava no laboratório de fotografia, fotografia analógica e tal. Como eu sempre gostei de fotografia, comecei nessa área com fotografia, conheci ele nesse laboratório.


Logo depois, durante um tempo lá, alguns anos depois, ele começou a me encher o saco com a ideia de que eu tinha que fazer um filme sobre o tio dele, algo que ele sempre teve vontade de realizar. Confesso que no início eu não dei muita bola para isso, mas ele continuou insistindo, foram anos de insistência [Risos]. Até que alguns amigos começaram a me cobrar pelo tanto que ele falava disso.


Então foi através da Marú, da Maria Amélia, que era e ainda é uma amiga nossa em comum. Ela que realiza o Festival de Jazz e Blues em Guaramirim, amiga das antigas. Marú me ligou um dia e falou: "Vamos fazer o filme do Bandeira, cara". E começamos a ver como viabilizar o projeto, como levantar dinheiro, se conseguiríamos apoio da Lei Rouanet, e foi a partir daí que tomei gosto. 


Me aproximei mais do Bandeira e comecei a ter acesso ao arquivo dele. Ele tem muita coisa, muita carta, muitos postais, muitos escritos do tio e sobre o tio. E aí eu comecei a ver e entender que o tio dele realmente merecia um filme, ele estava com toda a razão, daria samba a gente fazer um filme. 


Logo depois eu percebi que não seria tão fácil fazer um filme sobre Bandeira. Porque ele é um personagem que já morreu há 50 anos. Não tem nenhuma imagem em vídeo dele, a não ser aquela que a gente usa no último momento do filme, mas que não tem nada a ver, de certa forma, com a trajetória dele. Ali é uma imagem feita aqui no no Mucuripe. Por isso que eu deixei para para mostrar no final. Então comecei a perceber isso e percebi também que a maioria das pessoas que falavam do Bandeira falavam por conta de ter pesquisado alguma coisa, mas não tiveram convivência com ele. Porque aquelas pessoas também já tinham partido. Os grandes amigos dele como o [Arthur] Piza, que foi o último grande amigo dele vivo e faleceu em 2017. 


Então vi que ia ser esse desafio, fazer um filme com esse personagem com pouco material iconográfico. E a partir daí que eu pensei, Cara, vou fazer filme só com falas, então como é que eu vou contar essa história?” Quer saber uma coisa? Eu vou contar a história do jeito que ela me foi contada. Foi um cara que é alucinado pelo tio e que vive a vida inteira correndo atrás das memórias do tio.” Fui lá e fiz isso. Claro que o tratamento é um pouco ficcional. Uma camerazinha ali, ele entra em quadro como se fosse uma cena de ficção e tal. E ele faz dois papéis, o do sobrinho que procura o tio e lá na frente ele vira o tio. A gente tirou partido da semelhança física dos dois e transformou num tipo de alucinação.


Tem uma parte que poucas pessoas percebem, mas que o Francisco fala que ele foi tomado por aquela ideia, a ponto de começar a viver o próprio tio. Outro recurso foi utilizar os textos do Antonio, os poemas dele. Chamei o [Claudio] Jaborandy, que tem aquela voz mais grave e rouca e ele emprestou a voz aos textos do Antonio.


Então, o filme é contado a partir disso, desses dispositivos. O sobrinho que procura o tio, o tio que se manifesta através não só dos desenhos e pinturas, mas também da voz, da palavra, da opinião e que se expressa fundamentalmente através da arte dele principal, que era a pintura e que fez isso de uma maneira muito vigorosa, muito inteligente, muito inventiva.


Foi um cara que chegou na Europa naquele período em que estava todo mundo lá e ele percebeu o que é que estava acontecendo ali, e trouxe para o Brasil uma maneira de pintar que até então era completamente inovadora para aquele período. E as pessoas falam isso nos depoimentos do filme, se ele não tivesse falecido com seus 45 anos, hoje ele seria um artista mundialmente conhecido como o Pollock e tantos outros mestres que dialogavam com esta forma de expressão.

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Ávila Oliveira (Oxente Pipoca): Você falou da dificuldade de conseguir pessoas que tiveram contato com ele, e eu prestei bastante atenção nos nomes que apareceram nas entrevistas, e fique feliz de ver o Silas de Paula, que foi meu professor na no curso de Jornalismo da UFC, ele é um dos seres humanos mais brilhantes que já conheci. E então eu queria saber como é que foi essa escalação daquelas pessoas que estão no corte final do filme, como é que vocês chegaram naqueles nomes a partir do roteiro?


Joe Pimentel: Eu acho que você tem que fazer com que as pessoas que estão assistindo ao filme gostem daquele personagem, entende? Então fui procurar pessoas que eu percebi que eram literalmente aficcionados pelo Bandeira, que gostavam da obra dele e o admiravam, e não era só porque estudaram e poderiam dar aquele depoimento frio.


Eu vi um artigo de um livro que o Gilmar de Carvalho publicou, onde o Silas abordava essa questão da imagem, dele tratar muito bem essa coisa do seu registro e de estar um tempo à frente. Ele sacou isso, ele se vendia muito bem, fez uso isso muito bem. E ainda bem que ele fez isso, ainda bem que ele se fotografou para caramba. Ajudou muito a gente. [Risos] Eu fiquei pedindo um monte de fotos para quem eu sabia que poderia ter, e depois que o filme estava em processo de finalização as fotos continuaram chegando, e resolvi não mexer mais.


Mas enfim, fui atrás da Vera Novis, que é a biógrafa dele, ela tem um livro chamado Antonio Bandeira - Um Raro, mais duas pessoas que tinham feito um trabalho acadêmico, tinham ido em Paris estudar a obra do Bandeira, e para não ficar só nessa coisa dos especialistas, marchands, etc, eu chamei pessoas de outras áreas, inclusive, ia começar a fazer o filme assim, colocando pessoas de outra áreas que admiravam a obra do Bandeira.


Vai começar lá com o Waltinho Carvalho, que foi a primeira pessoa que eu filmei. Eu queria fazer encontros, mas acabei não conseguindo fazer esses encontros, dificuldade de produção, de data e veio a pandemia também, atrapalhou um pouco o filme. Aí coloquei lá o Halder [Gomes] com Fausto Nilo, que eram duas pessoas que eu sabia que gostam do Bandeira. O Halder é um cara que é alucinado por artes plásticas, ele é um professor. Você conversa com ele sobre artes plásticas, é um negócio absurdo, ele sabe muito mais daquilo do que de cinema.


Falo para ele que ele é um artista plástico frustrado [Risos]. Então é isso, eu acho que de uma certa forma, as pessoas falam com tanto tesão do Bandeira que o filme passa um pouco isso, você termina se interessando por ele. Pelo menos é isso que as pessoas têm falado. Alguns vem dizer que o filme te deixa interessando pelo Bandeira, mas que é um filme pequeno e eu acho que o filme é grande o suficiente.


Quando eu montei o filme, eu chamei algumas pessoas para assistir o filme aqui em casa, eu não estava montando na produtora para ficar mais confortável. Uma das pessoas que chamei foi o Halder e ao final perguntei o que ele tinha achado e ele disse: "Tá bom, o tamanho tá legal e tal". E eu pensei que tinha acertado porque é para esse tipo de público que o filme existe. Porque é um filme meio de nicho mesmo, não é um conteúdo para todos os públicos. Tanto é que a gente pretende, depois da distribuição nos cinemas, tentar disponibilizar ele em algum canal específico onde o público interessado tenha fácil acesso.


Ávila Oliveira (Oxente Pipoca): Confesso que eu tinha pouco conhecimento sobre o Antonio Bandeira até assistir ao documentário. Não sabia que ele também fazia poesia e nem que gostava de andar com um fotógrafo para fazer diversos registros seus. Existe algo sobre ele que você só aprendeu ou descobriu com ele durante o processo de realização do documentário?


Joe Pimentel: A verdade é que quando comecei a fazer o filme, a filmar, conversar com as pessoas, eu já tinha lido bastante, eu tinha conversado bastante com o Francisco. Tinha algo que eu percebi antes de começar a fazer o filme, que era quando eu ia conversar com as pessoas sobre o Antonio Bandeira sempre havia uma leitura meio folclorizada sobre ele. “Ah o Bandeira deu um murro em não sei quem, o Bandeira fez isso e aquilo” só faltavam dizer que ele teve um caso com a Rainha Elizabeth, porque de tudo se falava. Então, comecei a pensar no que era verdade disso tudo.


Aí comecei a pensar nisso. Imagina um cara que sai de uma cidade, uma província com 300.000 habitantes, vai para o Rio, depois vai para Paris, aí volta para cá. Tu imagina o folclore, entre aspas, que as pessoas criavam em torno dele, entende? Então, assim, eu ouvia muito disso e o filme fala sobre esse tipo de destaque.


Inclusive, tinha pessoas que estão no filme que, durante o processo, tinham uma opinião sobre o Bandeira, eu senti que no meio dos questionamentos que eu fiz, começaram a mudar a perspectiva em relação ao que estavam falando. 


Tinha alguns depoimentos, alguns fragmentos de depoimentos que levavam para esse lado dele. O Bandeira que bebia e que andava nu pelas ruas de Paris, correndo atrás de freiras e tal. Eu não estava interessado nesse cara. Estava interessado em dizer que ele era um cara brilhante, que comeu o pão que o diabo amassou, chegou lá e aconteceu. E mais do que isso, dizer qual foi o cenário em que isso aconteceu. O que é que estava acontecendo nesse universo das artes plásticas no mundo e depois no Brasil. 


Ávila Oliveira (Oxente Pipoca): Para finalizar, eu queria que indicasse para os leitores desta entrevista alguns filmes brasileiros, dois ou três, que você tenha como favoritos, ou que tenham influenciado você, ou acha que as pessoas deveriam conhecer mais. 


Joe Pimentel: Tem um filme brasileiro que eu gosto muito, que é o Estômago (2007). Eu adoro esse filme. Acho que todos nós temos que assistir e reforçar essa ideia de assistir o filme do Waltinho [Ainda Estou Aqui], que está fazendo o maior sucesso.


Até falei hoje numa entrevista, a gente está batendo palma para esse filme, mas é um tipo de cinema que a gente não faz tanto aqui no Brasil. Que é um cinema mais competitivo, um cinema com mais recursos. A gente faz muito cinema, mas é muito cinema para pouca gente ver, sabe? E eu questiono muito esse modelo da gente fazer cinema. Claro que tem filmes que são necessários fazer, que não necessariamente tem que ter bilheteria e tudo mais.


Mas eu acho que a gente poderia transformar esse cinema, se livrar um pouco das garras do Estado, não ficar com essa leitura tão paternalista. Então assim, é muito filme e pouquíssima distribuição dos filmes. A gente precisa repensar um pouco esse modelo. 


Tem um cinema muito vigoroso que é o cinema brasileiro do período lá dos anos 80, 90, de grandes mestres aqui do nosso cinema, como o Walter Lima Jr. e documentários do Eduardo Coutinho que são essenciais, como Cabra Marcado Para Morrer (1984).  E é isso, torço que o nosso cinema consiga se firmar cada vez mais e que a gente consiga não só passar a fazer muitos filmes, o que estamos conseguindo graças a Deus, voltamos a fazer através dessa lei de incentivo, mas que a gente possa fazer o brasileiro assistir a esses filmes? E para isso é preciso vários mecanismos que a gente tem que pensar como um todo.


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