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Análise | The Last of Us 2x04 (“Day One”): A conexão nas interseções do fim do mundo

  • Foto do escritor: Ana Bia Andrade
    Ana Bia Andrade
  • há 2 dias
  • 5 min de leitura

O episódio abre espaço para o afeto, mas a série ainda evita colocar Ellie no centro de sua própria vingança.

Divulgação


(CONTÉM SPOILERS DO EPISÓDIO)


No último domingo (4), The Last of Us apresentou o quarto episódio da segunda temporada, intitulado “Day One”. Desde o impactante segundo capítulo — marcado pela invasão de Jackson pelos infectados e pela morte brutal de Joel (Pedro Pascal) —, a série tem expandido seu foco, explorando novos núcleos de personagens e aprofundando a trajetória de Ellie (Bella Ramsey) diante do trauma e da relação crescente com Dina (Isabela Merced).


Logo nas primeiras cenas, o episódio traz um flashback protagonizado por Isaac Dixon (Jeffrey Wright), ex-sargento da FEDRA que, por divergências ideológicas, abandona a organização e se junta à WLF. Vale pontuar, no entanto, que sua insatisfação com a FEDRA não o isenta de atos de violência contra outros grupos rivais, como evidencia a cena de tortura brutal a um jovem serafita. 


Essa é — e precisa ser — uma das marcas mais fortes de The Last of Us: não traçar narrativas maniqueístas entre bem e mal, mas sim, representar os limites da humanidade em um mundo sem salvação.


Outro ponto forte é que as cenas que marcam o conflito entre Serafitas e Lobos nos lembram de que existe um mundo fora dos muros de Jackson, que inevitavelmente colidirá com os interesses de uma garota de 19 anos. As guerras do mundo seguem em curso, mesmo quando a sua mal começou.


Esse desenvolvimento de núcleos paralelos já é explorado desde a primeira temporada e faz parte da construção desse universo narrativo. É importante perceber que os infectados representam apenas uma parte do problema — as verdadeiras ameaças vêm da política do olho por olho, das diferenças e da crueldade humana. Muitas obras que retratam períodos apocalípticos têm essa consciência, mas nem sempre conseguem administrar bem diferentes personagens e motivações. A série, felizmente, vem acertando nisso.


Agora em Seattle, Ellie e Dina exploram a cidade, encontram refúgio e se preparam para invadir o prédio da WLF durante a noite. É nesse intervalo que The Last of Us entrega um dos momentos mais sensíveis da temporada até agora: Ellie encontra um violão e dedilha a música “Take On Me”.


A cena é contida, triste, mas também muito bonita. Os acordes ensinados por Joel e a atenção plena de Dina transmitem uma conexão profunda entre as duas. Este episódio representa um divisor de águas na relação do casal, e a química entre as atrizes é evidente — fortalecendo ainda mais o impacto da cena como uma das mais memoráveis até aqui.


Com a chegada da noite em Seattle, é preciso dar a César o que é de César: reconhecer o valor de uma boa cena de ação. Agora, Ellie e Dina não estão mais fora do radar dos Lobos e percebem, mais do que nunca, que estão adentrando um território hostil. A sequência dos enforcados, seguida da perseguição pelos soldados da WLF e da horda de infectados nos túneis, traz a tensão que nos mantém vidrados na televisão.


Outro momento importante da narrativa também é adaptado neste episódio: a descoberta da imunidade de Ellie por Dina. Quem jogou The Last of Us Parte II sabe que esse acontecimento ocorre de forma diferente nas duas mídias, e com razão. Na série, os esporos não fazem parte da história, então o momento da máscara de ar não se aplica ao contexto do Cordyceps apresentado até agora.


Dito isso, a mordida no braço de Ellie gera um choque ainda mais imediato em Dina, o que considero um acerto da adaptação para a linguagem da TV. No entanto, o desenrolar dessa revelação não me agradou por completo.


O impacto em Dina é palpável e sua reação, justificável. Aliás, bela performance da atriz Isabela Merced. Ellie tenta explicar sua condição enquanto sua melhor amiga, e até então amor platônico, aponta uma arma para ela. Até esse ponto, tudo me agrada. Mas quando Dina, ainda abalada, revela sua própria bomba emocional — uma gravidez inesperada —, o roteiro parece optar por um atalho.


O resultado é uma explosão de sentimentos que culmina na cena de sexo entre as duas, extremamente simbólica para a construção desse relacionamento. Porém, sinto que a narrativa adotou a estratégia de "estamos muito à flor da pele, vamos colocar tudo para fora de uma vez”, o que soa como uma maneira prática, e rasa, de avançar a trama.


Afinal, o que a gravidez de Dina representa para os planos de vingança de Ellie? Há uma breve relutância no final do episódio, mas que se resolve facilmente com um "estamos juntas nisso", o que soou meio frustrante. São questões complexas tratadas de forma simplificada — a descoberta da gravidez com testes achados durante a missão, e a revelação a Ellie seguida de um tão aguardado beijo apaixonado. Tudo se resolve rápido demais.

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Outra camada que ainda me soa incoerente, e que espero ver melhor desenvolvida nos próximos episódios, é o sentimento de vingança que deveria mover a jornada de Ellie.


Não se trata de comparar com o material original (até porque mídias diferentes pedem decisões diferentes), mas mesmo considerando apenas a série, há uma sensação de que Ellie está racionalizando a morte de Joel de forma surpreendentemente controlada. E isso me impede de comprar totalmente sua motivação. Para tomar esse risco, seria preciso transmitir um sentimento mais implacável de dor, fúria e perda. Algo que, por vezes, parece ausente.


Sabemos que o luto é complexo, com muitas facetas. No entanto, algumas decisões da série diluem a intensidade emocional que deveria estar presente quando Ellie decide colocar não só a si mesma, mas também Dina, em uma situação quase suicida. Sinto falta de um roteiro que exija uma postura mais madura da protagonista ao reconhecer o peso do que está fazendo: tentar matar a integrante de uma milícia armada e treinada.


Na série, sinto que essa carga vingativa é subtraída e ainda dividida por dois, já que desde o primeiro episódio, vemos que Dina tinha uma forte conexão com Joel —  até mais do que nos jogos. Isso acaba dividindo o foco emocional, o que pode funcionar, mas também enfraquece a singularidade da dor de Ellie. Não acho que seja uma falha de interpretação de Bella Ramsey, até porque sabemos do seu potencial dramático, mas sim, da escrita da série.


No mais, “Day One” marca o início de uma nova fase para Ellie e Dina e também reforça que existe um mundo alheio às motivações do nosso casal. Um mundo que inevitavelmente cobrará seu preço por adentrarem nessa guerra. Esperamos que a série continue a entregar bons momentos de ação, melhore a construção de informações impactantes e, ainda, mantenha o belo afeto que floresce nas interseções do apocalipse.


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