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Crítica | Frankenstein (Mostra de SP 2025)

  • Foto do escritor: Vinicius Oliveira
    Vinicius Oliveira
  • 17 de out.
  • 3 min de leitura

Visão de Del Toro para o clássico gótico está repleta das suas marcas, mas nem sempre alcança o coração pulsante no centro da história

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Foto: Reprodução/Netflix


Adaptado, interpretado e ressignificado incontáveis vezes nas mais variadas mídias, Frankenstein, de Mary Shelley, pode ser visto como o romance fundamental para tratar da figura do monstro. Diante disso, não é nenhuma surpresa que por anos Guillermo Del Toro, cineasta que construiu sua carreira e reputação em cima do seu amor por monstros, tenha tentado dirigir sua própria versão do clássico. O resultado final enfim chega agora em 2025, após anos de desenvolvimento.


Na versão de Del Toro para o livro, Victor Frankenstein (Oscar Isaac) um cientista brilhante, mas megalomaníaco, está disposto a tudo para provar que é capaz de superar a própria morte. Financiado pelo tio inescrupuloso (Christoph Waltz) da sua futura cunhada (Mia Goth) – por quem está apaixonado –, Victor enfim dá vida à inominável criatura (Jacob Elordi), mas seu tratamento desumano a ela logo põe criador e criatura em rota de colisão, destruindo a tudo e todos no processo.


É inegável que seu Frankenstein está repleto das suas marcas autorais, que apontam para o projeto dos sonhos do diretor. Pode se dizer, aliás, que estas marcas aqui são ainda amplificadas: as lentes distorcidas que já vinham dando as caras em A Forma da Água e O Beco do Pesadelo são retomadas com ainda mais intensidades, além da trilha sonora estrondosa de Alexandre Desplat e de um trabalho de direção de arte suntuoso e desavergonhadamente gótico, que contribuem para o senso de escala que o longa oferece, gritando grandiosidade (e exagero) em cada plano.


Este exagero é reforçado por um uso significativamente maior de CGI, que aponta para um certo aspecto “artificial” que parece ser proposital por parte de Del Toro. No entanto, não sei se a projeção da Cinemateca, onde assisti ao filme, prejudicou a taxa de resolução ou isso era do próprio filme, mas a sensação em cenas mais dependentes do CGI era de se estar vendo a cutscene de algum videogame, me trazendo traumas de guerra da famigerada trilogia d’O Hobbit de Peter Jackson (na qual Del Toro foi creditado como corroteirista, vale lembrar).

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Foto: Reprodução/Netflix


A presença destas marcas autorais em uma maior escala não seria um problema não fosse o fato de que elas não desviam o filme do seu principal problema: a dificuldade de encontrar seu tom e coração. Após um prólogo impactante, que enquadra a narrativa que veremos a seguir, Frankenstein demora cerca de 30 a 40 minutos para superar seu começo morno, onde toda a contextualização da vida de Victor é oferecida. Isaac está ótimo no papel do cientista louco arquetípico, projetando a raiva, insegurança e megalomania do personagem, mas mesmo ele só cresce quando Elordi entra definitivamente em cena.


Admito que, quando foi anunciado que Elordi estaria substituindo Andrew Garfield no papel da criatura, tive minhas dúvidas, mas o ator australiano comprova mais uma vez que é um dos nomes mais interessantes da sua geração ao entregar um “monstro de Frankenstein” (ah, a vontade de só se referir a ele como Frankenstein!) que é tão gentil e compassivo quanto odioso e furioso. Todo o bloco dele como o “Espírito da Floresta”, com seu ar de fábula, é um destaque dentro de um filme que muitas vezes se mostra um tanto inchado, sendo o bloco que melhor concilia a proposta de Del Toro de olhar para a contradição humana, a nossa capacidade de reagirmos com amor e violência em igual medida.


Ambos os atores brilham tanto nesse embate cada vez mais violento e trágico que é nítido como todo o restante do elenco é subutilizado. Veteranos como Waltz e Charles Dance fazem o que podem dentro do seu limitado tempo de tela, enquanto David Bradley se mostra outro destaque como o idoso cego com o qual a criatura faz amizade. Mas Felix Kammerer é apagado demais para que nos importemos com a simbologia da bondade do seu William, e Mia Goth seja talvez o maior desperdício, funcionando mais na teoria do que na prática com este papel dual de mãe e amada de Victor. A ideia de um romance entre ela e a criatura (que certamente remete a outro clássico dos monstros, Drácula) não convence em quase nada, soando como uma ideia jogada e que nunca consegue transmitir a relevância que se pretende para ela na narrativa.


Frankenstein, tal qual a natureza humana, é um filme de contradições que ora se anulam ora se complementam. É perceptível o esforço e a paixão de Del Toro pelo projeto, o que ao menos confere uma identidade ao filme que pode distingui-lo da seara estéril de blockbusters contemporâneos. No entanto, como muitas vezes acontece em projetos pessoais e passionais, tais paixões blindam para os problemas que o filme carrega e que mitigam seu potencial de se tornar um clássico como outras encarnações do monstro no cinema.


Nota: 3/5

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