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Crias do Brasil #01 | Luciano Pedro Jr.: "Foi no palco que tive um sentimento de estar contando histórias enquanto meu corpo escrevia no espaço"

  • Foto do escritor: Ávila Oliveira
    Ávila Oliveira
  • 16 de mai.
  • 10 min de leitura

Atualizado: 22 de mai.

Na matéria inaugural do quadro, o artista-pesquisador alagoano fala sobre sua trajetória artística e como 'Carro Rei' abriu portas para novos projetos no cinema brasileiro.


Há tempos o Oxente Pipoca vem realizando entrevistas com artistas de diversas obras nacionais (e até internacionais), sejam atores e atrizes ou realizadores. Hoje, porém, damos início a uma nova proposta: o quadro Crias do Brasil. Trata-se de um espaço voltado a entrevistas em formato de perfil com novos(as) nomes do audiovisual brasileiro, tanto iniciantes quanto aqueles(as) que já estão se destacando há um tempo. O intuito com essas entrevistas é conferir visibilidade às suas trajetórias e carreiras e evidenciar a potência do nosso cenário artístico contemporâneo com os novos rostos que têm surgido.


Para sua edição inaugural, o Crias do Brasil traz uma entrevista com Luciano Pedro Jr., artista-pesquisador natural de Maceió (AL) que desenvolve trabalhos e pesquisas através das linguagens das artes cênicas. Passando por alguns processos formativos, Luciano concilia a dedicação entre estudos e práticas que vão da dança até o cinema, e formado em Licenciatura em Teatro na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).


Confira abaixo a entrevista completa com Luciano:


Ávila Oliveira (Oxente Pipoca): Você trabalha como ator de teatro e de cinema, mas te acompanho no Instagram e sei que você tem uma habilidade incrível com a fotografia e também com a dança. Quando você descobriu seu interesse pelas artes e quando decidiu que queria viver de arte? 


Luciano Pedro Jr.: Olha, desde muito cedo eu adorava “imitar” pessoas. Uma lembrança forte que tenho é de amar Calypso e passar tempos dançando como a Joelma. Só que tudo isso ainda era uma grande brincadeira e diversão, e que não tinha intuito algum que não fosse me dar alegria e fazer os outros rirem também. Um pouco mais tarde, já adolescente, eu comecei a andar de skate e escrever, e essas duas práticas foram um marco divisório na minha vida. O skate me abriu para um mundo de possibilidades e perspectivas que eu não tinha até aquele momento, e daí surgiu meu interesse por cinema, música, desenho, roupa, pintura, porque eram elementos que estavam muito presentes na cultura urbana. No skate, a gente customiza a própria roupa; filma e edita os vídeos; pensa na trilha sonora; desenha na madeira, enxerga a cidade e sua arquitetura de outro modo, enfim… Tudo isso foi me despertando um olhar artístico mais aprofundado e mais no sentido prático (tátil) da coisa.


Um tempo depois, comecei a escrever, e isso foi algo que mudou radicalmente minha vida. Eu vivia escrevendo textos no computador, e depois apagava tudo. Meu pai ficava sem entender e me questionava, e eu respondia que fazia aquilo pra alimentar meu imaginário, para fazer uma espécie de atletismo do meu coração também. E para mim, era muito prazeroso poder imaginar situações impossíveis e absurdas: pensar em alguém e escrever uma história sobre, e assim começar a fabular as coisas que ainda não tinham sido vistas por mim. Já na escola, eu comecei a fazer teatro, graças a um professor de literatura, Jason Santana. Lembro que na época, ele me fez uma pergunta sobre religião, eu respondi do meu jeito, e ele falou: “está bem, estude esse texto aqui, e quinta-feira apareça na aula de teatro”. Eu fiz isso, e acredito que foi ali que meu interesse teve sua completude. Quando pisei no palco, tive um desejo de prolongar as horas para que aquele momento jamais acabasse. E foi ali que eu tive um sentimento de estar contando histórias enquanto meu corpo escrevia no espaço. Foi tão mágico e assustador ao mesmo tempo, que eu tinha o desejo de me revelar e me esconder ao mesmo tempo, e aí equilibrar esse caos dentro de mim só era possível através da atuação, e quando senti isso, tudo fez muito mais sentido.


Sobre decidir que queria viver de arte, confesso que não pensei muito nisso. Antes de tudo, eu só queria ter a possibilidade de exercer meu ofício, fazer a minha diversão. Eu lembro de assistir uma peça chamada Guerra, Formigas e Palhaços há uns anos atrás, e quando eu vi aquilo, eu fiquei: “ok, é isso que quero fazer pro resto da vida”. Nesse espetáculo tinha um ator, Enio Cavalcante, que me despertou muito esse desejo de viver aquilo que eu estava assistindo, e aí quando entrei pra faculdade de Teatro, foi quando percebi que eu realmente não queria fazer outra coisa da vida que não fosse trabalhar com arte. E falo arte em geral, porque sempre fui fascinado pela escrita, fotografia, marcenaria, dança, enfim… Então meu desejo era esse mesmo. E aí fui cursando Teatro na Universidade Federal de Pernambuco, fui fazendo testes de elenco, fui passando em alguns, e comecei a fazer curtas, longas, participar de residências. E aí quando me peguei viajando pra trabalhar, conhecendo novos lugares, pessoas, culturas, indo em festivais e trocando com o público, eu senti que era desse jeito que eu queria viver a minha vida.


Ávila Oliveira (Oxente Pipoca): Quais nomes do cinema ou da televisão brasileiras você tem como referência no seu trabalho como ator? Existe algum ator ou atriz com quem você tem aquela vontade de fã de contracenar junto?


Luciano Pedro Jr.: O Brasil tem atores e atrizes incríveis, que desde muito cedo eu cresci vendo e acompanho até hoje. Alguns que eu tenho como referência pelas incríveis performances que já vi, como Matheus Nachtergaele, Marcélia Cartaxo e Rejane Faria, eu já pude ter a honra de contracenar e foi incrível, porque são pessoas que atuam com uma beleza, dignidade e respeito pelo ofício, que me emociona demais. Eu sempre pensei que se eu não fosse ator, adoraria ser atriz, e se fosse pra ser uma atriz que eu fosse como Marcélia Cartaxo. Facilmente eu diria essas três pessoas, mas têm alguns outros nomes que não tenho como negar a minha profunda admiração pela forma como fazem seu trabalho, pela entrega e pelo resultado mesmo.


Fabrício Boliveira, muito possivelmente, é minha maior referência. O jeito como ele se entrega, como muda radicalmente de personagem pra personagem, as escolhas, as investigações, a inquietação, a verdade dele em cena é uma coisa impressionante. Grace Passô também é uma força da natureza sem igual, e de uma excelência absurda, pessoa que certamente sou fã. E se fosse para listar bem brevemente aqui, quem eu desejo muito contracenar seria: Fabrício Boliveira, Grace Passô, Karine Teles, Júlio Andrade, Irandhir Santos, Lucas Andrade, Demick Lopes, Belize Pombal e Dira Paes e Jesuíta Barbosa. É difícil escolher porque temos muitos e muitos artistas incríveis da cena, mas creio que os nomes que estão aqui são os que mais ficam na minha cabeça por agora.


Ávila Oliveira (Oxente Pipoca): Você tem um grande volume de trabalho em projetos de Pernambuco, que é um dos maiores polos de cinema do Brasil. Mas o cinema alagoano, assim como o de vários outros estados menores do Brasil, vem ganhando força e espaço no cenário nacional e internacional muito graças aos incentivos públicos e editais. Como você vê esse atual momento do cinema alagoano e quão importante para você foi ter sido “abraçado” pelo cinema pernambucano? 


Luciano Pedro Jr.: Olha, tem sido um momento lindo mesmo para o cinema alagoano, e isso porque ainda não saiu nem metade dos filmes incríveis que estão para estrear em 2025 e no ano que vem. Têm curtas-metragens e longas com roteiros primorosos e com uma qualidade técnica muito boa, alguns que já estão circulando e outros que estão ainda em pós, e há também os projetos que estão em laboratórios e em desenvolvimento, e que com certeza vão render bons frutos. Alagoas tem passado por um processo de organização do audiovisual e de formação, que tem contribuído para que a gente se profissionalize ainda mais através de oficinas e cursos teóricos e práticos como os oferecidos pela Aguda Cinema, Animal Coletivo, Escola Criattiva, dentre outros.


Consequentemente, temos tido um amadurecimento para que a gente coloque cada vez mais nossos projetos no mundo, e falo mundo, porque temos projetos que foram premiados internacionalmente, a exemplo do curta Infantaria, de Laís Araújo, que ganhou o prêmio especial do júri de melhor filme na Mostra Generation na Berlinale. E temos também outros curtas que circularam muito por festivais em outros países, como o Queima Minha Pele de Leonardo Amaral, que foi para o Festival de Havana e o Uppsala, ou como o Cavaram uma Cova no Meu Coração, de Ulisses Arthur, que recentemente esteve no FICCI na Colômbia e no DOC.LISBOA, além de circularem por diversos festivais importantes do cinema nacional.


Acho fundamental citar aqui alguns nomes que vale muito ficar atento porque são nomes que já possuem um currículo, e que estão com projetos no forno, como: Ulisses Arthur, Rafhael Barbosa, Laís Araújo, Janderson Felipe, Lucas Litrento, Paulo Silver, Stella Carneiro, Fernando Santos, Nuno Lindoso, Gabriela Araújo, Marina Bonifácio, Leonardo Amaral, dentre outros. Alguns desses nomes eu já trabalhei junto atuando e outros tenho o desejo de em algum momento poder colaborar.


Já sobre ter sido abraçado pelo cinema pernambucano, creio que foi um dos maiores presentes que já recebi na vida. Meu primeiro longa foi em Pernambuco, uma participação muito rápida em Paterno, de Marcelo Lordello, mas justamente através do produtor de elenco que eu recebi a indicação para fazer meu primeiro longa em Alagoas, e daí então, começou a ter mais convites para testes ou até mesmo convites já para integrar o elenco. Estar em Pernambuco, para além da universidade, foi uma oportunidade muito legal de poder ver outros trabalhos, de trocar, conhecer profissionais da área. Fazer cinema em Pernambuco tem um certo prestígio. Lembro que a primeira vez que fui na Globo, e falei dos meus trabalhos no cinema alagoano e pernambucano, a galera ficou muito curiosa e querendo conversar sobre. E ter trabalhado com nomes como Renata Pinheiro, Marcelo Lordello, Pedro Severien, Bruna Leite, Juliana Soares, Igor Travassos, Cecília da Fonte e agora com Caio Dornelas foi algo que realmente me deu uma possibilidade de conhecer o cinema para além das minhas próprias fronteiras. O cinema pernambucano é muito aclamado, pelo trabalho que pessoas daqui fizeram há muito tempo atrás e isso foi se mantendo como uma tradição de um lugar que é apaixonado por cinema. Poder estar nisso me deixa muito feliz, e acredito que ainda estou no começo de tudo.


Ávila Oliveira (Oxente Pipoca): “Carro Rei" foi vencedor de Melhor Filme no Festival de Gramado de 2021 é o trabalho pelo qual você é mais reconhecido, afinal foi seu primeiro trabalho como protagonista num longa-metragem. Como foi para você “conduzir” esse filme que é tão distinto, tão único na forma e no conteúdo? E você acha que de alguma forma ele ainda reverbera na sua carreira? 


Luciano Pedro Jr.: Olha, foi uma baita de uma responsabilidade. Já conhecia o trabalho de Renata por conta do Amor, Plástico e Barulho, filme que que gosto muito e que tem um elenco muito absurdo. Quando recebi a notícia de que ia fazer, fiquei muito feliz e ao mesmo tempo assustado, afinal de contas eu estava para protagonizar um longa em Pernambuco e de uma diretora já reconhecida pelo seu trabalho. Além de tudo, o filme é um tipo de projeto arriscado, fazer um filme de realismo fantástico, no agreste pernambucano, sobre carros, era uma grande loucura, mas acho que reside aí também a potência do filme. Renata na direção tem um pensamento estético muito particular, que conversa muito com o trabalho que ela já fazia no cinema, só que no departamento de arte. O universo que ela cria pra gente [atores] é muito propício pra você mergulhar na cena e encarar as viagens todas. Se você reagir ao cenário dela, creio que boa parte do trabalho já está sendo feito.


Sobre conduzir o filme, eu era considerado o protagonista, mas na verdade acho que o grande protagonista do filme é o Carro Rei. O filme dá essa vida aos carros porque o ser humano passou a humanizar os objetos e objetificar os humanos. E aí para a gente entender isso, na pele mesmo, passamos por uma experiência imersiva de preparação junto da preparadora Raíssa Gregori, também tivemos aulas de oficina mecânica em Caruaru, eu passei um tempo andando de bicicleta pela cidade, estudei agroecologia, enfim.. todas essas coisas que a gente faz pra poder se aproximar mais do personagem. O filme reverbera na minha carreira porque sinto que de algum modo foi ele quem me abriu portas para outras possíveis seleções de elenco.


O produtor de elenco do filme, Marcelo Caetano, foi uma pessoa muito generosa comigo e passou a me indicar para outros projetos, ele e Gabriel Domingues, e isso foi muito positivo para minha carreira. Além disso, o filme circulou por alguns festivais que são considerados importantes para o cinema fantástico, ele estreou em Rotterdam, que é um dos principais festivais de cinema da Europa, e tudo isso repercutiu em notícias, críticas, divulgação… Mas acho que mais do que isso tudo, quando o filme foi grande vencedor do Festival de Gramado, ali deu um “boom”, porque muita gente veio falar comigo, compartilhou a notícia dos prêmios, pessoas assistiram e vieram trocar ideia, elogiar, fazer algum tipo de crítica.


Mas acredito, que para além dessas coisas todas, o que foi muito fundamental pra mim nessa experiência, é que foi nela que eu tive o meu primeiro momento de viver por tanto tempo uma experiência cinematográfica. Foram dois meses e meio longe de casa, imerso num processo, com uma curiosidade de perturbar cada departamento tirando dúvidas sobre figurino, arte, foto, som, continuidade, essas coisas todas que compõem o fazer cinema.


Ávila Oliveira (Oxente Pipoca): Quais projetos você já tem para os próximos meses ou próximos anos? Seja no cinema ou na televisão/streaming. 


Luciano Pedro Jr.: Agora, neste exato momento, estou protagonizando um longa em Pernambuco, que se chama Diabos de Fernando, de Caio Dornelas. Um filme de época, que se passa durante a década de 1940 em Fernando de Noronha e que nele interpreto Fausto, um ex-marinheiro e preso político.


Têm dois longas que eu integro o elenco principal, co-protagonizando e protagonizando, que estão em um processo bem adiantado já de pós, um que se chama Não Estamos Sonhando, de Ulisses Arthur e o outro é Olhe para Mim, de Rafhael Barbosa. Esse ano filmei um longa chamado Pedra Riscada, de Glauber Xavier, que também estou no elenco principal. Esse ano, no segundo semestre, sai o Deus Ainda é Brasileiro, que é o último longa do Cacá Diegues, e que também estou no elenco.


E tem também alguns curtas, um que estreou na Mostra Tiradentes, que se chama Phoenix Club, de Gabriela Araújo, e outro que protagonizo que se chama O Primo Holandês, de Nuno Lindoso, que tem sua estreia na edição do Curta Cinema esse ano. E tem alguns projetos mais em fase de pós, como o Ajude os Menor, de Janderson Felipe e Lucas Litrento, que é um faroeste numa construção civil, um curta bem bacana, que em breve circula nos festivais. Ainda esse ano, eu filmo Miami, um longa de Werner Bagetti, e também lanço dois curtas que escrevi e dirigi: Brincadeira de Criança e O mapa Em que Estão os Meus Pés. E, ainda sem data definida de estreia, mas também estou no elenco de uma série incrível da Amazon, mas que ainda não posso soltar a informação. Desculpa… [risos] No mais, é isso. Tem muita coisa incrível vindo aí.


Acompanhe as redes sociais de Luciano para não perder os próximos passos de sua carreira. E claro, aqui no Oxente Pipoca seguimos de olho em tudo.

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