Entrevista | Fabrício Bittar fala sobre “Inexplicável”
- Vinicius Oliveira
- 10 de mai.
- 6 min de leitura
Atualizado: há 19 horas
Longa, que tem sido um sucesso internacional na Netflix, foi tema da entrevista do Oxente Pipoca com o diretor.

Desde que entrou no catálogo da Netflix, o longa-brasileiro Inexplicável tem sido um grande sucesso, sendo o terceiro filme em língua não-inglesa mais visto no mundo no mês passado, além de ter entrado no top 10 de 19 países. Dirigido por Fabrício Bittar e estrelado por Letícia Spiller e Eriberto Leão, o filme é inspirado no livro O Menino Que Queria Jogar Futebol, do jornalista paraibano Phelipe Caldas, o qual conta a história real de Gabriel Varandas, que em 2013, aos 8 anos de idade, foi diagnosticado com um tumor extremamente agressivo no cérebro, mas conseguiu sobreviver à doença após semanas internado.
O Oxente Pipoca teve a oportunidade de entrevistar Fabrício, que falou acerca do seu interesse pela história de Gabriel, o grande sucesso do filme na Netflix e o os diálogos que ele promove acerca do embate entre fé e ceticismo. Você pode conferir a entrevista completa abaixo:
Vinícius Oliveira (Oxente Pipoca): Como você conheceu a história de Gabriel? O que te motivou a levar essa história para as telonas?
Fabrício Bittar: Eu estava procurando histórias reais, estou sempre olhando histórias que podem virar filmes. E aí encontrei essa, foi uma história que na época, até pela ligação do Gabriel com o Fluminense, tiveram muitas notícias. Então eu vi que tinha sido publicado um livro, o livro de Phelipe Caldas, foi uma publicação independente. Eu consegui achar o livro num sebo online, comprei, li e fiquei muito impressionado com a história.
Sempre falo que Phelipe é jornalista, então ele conseguiu contar a história ali com todo o rigor do jornalista, mas ao mesmo tempo com uma sensibilidade, por conhecer a família e pelo talento dele de colocar muita emoção. Então muitas das cenas do livro já eram cenas cinematográficas. Então, eu vi o potencial do filme, conversei primeiro com Phelipe, depois com a família, Marcus e Yanna, que autorizaram e deram toda a liberdade pra gente trabalhar. E aí deu certo e a gente trabalhou nessa adaptação.
Vinícius Oliveira (Oxente Pipoca): Falando neles, o cerne do filme é o conflito entre a fé de Yanna (Letícia Spiller) e o ceticismo de Marcus (Eriberto Leão) diante de todo o drama pelo qual Gabriel passa. De que modo você buscou representar esse conflito? E como você o avalia dentro da sociedade contemporânea?
Fabrício Bittar: Essa talvez seja a única grande mudança da adaptação. Tanto no livro, quanto na história real, Marcus não era esse cético que aparece no filme, ele sempre foi também mais religioso, sempre teve fé ali. Essa mudança aconteceu por dois fatores. O primeiro fator foi porque é óbvio que, quando você faz um filme, de alguma forma você está trazendo questões pessoais também. E esse conflito é muito meu, então até algumas frases ali do Marcus, essas mais céticas, eram frases que eu sempre usei, são questionamentos meus.
Ao mesmo tempo, a gente precisava também de um conflito, porque o roteiro cinematográfico precisa desse conflito, até para que a gente consiga sustentar a narrativa. O nome do livro é O Menino que Queria Jogar Futebol, mas depois do roteiro e entendendo muito o que eu tinha ou de alguma forma queria construir com o filme, a gente chamou de Inexplicável, porque a ideia do filme não é colocar uma resposta pronta, nem dizer um certo ou errado. Acho que a proposta que a gente queria com o filme era mostrar a história do jeito que ela é.
E aí tem uma coisa na história do filme que me interessa, que é: quando você tem uma situação muito difícil na sua vida, você consegue sustentar a sua descrença? Essa é a questão, essa que é a pergunta que eu faço. A gente vem recebendo uma enxurrada de mensagens positivas sobre o filme, de pessoas que estão se identificando, que estão se inspirando, mas é óbvio que a gente recebe algumas mensagens dizendo que o filme seria pró alguma religião, até que seria proselitista, enfim. Enquanto na minha visão, o filme discute exatamente o que você faz quando todo o resto não funciona. Então uma pergunta que às vezes fico pensando que eu faria para pessoas que não acreditam em nada é: como é que você fica diante do leito do seu filho doente com essa descrença total? Como é que você, a pessoa que não acredita em nada, lida com isso?
Vinícius Oliveira (Oxente Pipoca): Já que você falou sobre o sucesso do filme, ele tem se destacado bastante na Netflix, inclusive a nível global. A que você atribui esse sucesso internacional? É porque o público gosta de histórias de superação num geral ou você acredita que o filme possui um diferencial em relação a outras obras do gênero?

Fabrício Bittar: Então, eu acho que as pessoas se identificam muito com a história, eu acho que é uma história que coloca você para refletir. Você pode não gostar, mas de alguma forma vai se sensibilizar, porque da mesma forma que a doença do Gabriel acontece de forma completamente inesperada e muda completamente a vida daquela família, isso pode acontecer a qualquer momento com qualquer um. E a verdade é que ninguém está preparado para isso. A gente vive a nossa vida sem pensar muito na morte, em doenças, nessas mudanças, até porque se você ficar pensando nisso vai enlouquecer, mas o fato de você não pensar faz com que também não esteja preparado. Então, eu acho que essa reflexão toca muito as pessoas em qualquer lugar do mundo.
Uma outra coisa que eu acho que é muito interessante, e isso me deixa muito feliz, é de que o filme consegue também entregar um pouco de conforto para quem viveu ou para quem para quem está vivendo essa situação agora. Muitas vezes, quando se vive uma situação muito difícil, você fica se questionando do porquê, fica achando que é só com você e fica se culpando sobre o que fez errado. E eu acho que o filme mostra que pode acontecer com qualquer um.
Uma coisa que me deixa muito feliz nas mensagens que a gente está recebendo é que ele não tem um nicho específico. A gente recebeu mensagem de todas as religiões, de todas as idades, de todas as classes sociais, é um filme que atrai todo mundo. Outro dia, postaram no Instagram uma criança que está assistindo repetidamente o filme, Acho muito interessante que realmente o filme pegou todo tipo de pessoa. Então, acho que é um pouco isso, as pessoas entendem que é uma história que poderia acontecer com qualquer um, seja com a própria pessoa ou uma pessoa próxima, e isso acaba mexendo muito. E eu acho que o filme também mostra um senso de comunidade, né? Como a comunidade se organiza e se ajuda em momentos difíceis, acho que isso gera uma conexão importante também.
Vinícius Oliveira (Oxente Pipoca): Por fim, nós do Oxente Pipoca sempre gostamos de pedir aos nossos entrevistados que indiquem obras nacionais que achem que o público deveria assistir. Quais são suas indicações?
Fabrício Bittar: Eu acho que o cinema nacional produz filmes incríveis, e uma coisa que eu fico um pouco triste de escutar, que eu peguei várias mensagens de pessoas falando assim: "Ah, eu tenho muito preconceito com um filme nacional, mas este é bom, esse eu assisti". Eu acho que as pessoas falam isso exatamente sem assistir aos filmes.
Acho que o primeiro filme que eu indicaria é um chamado Benzinho, com a Karine Teles, a Adriana Esteves, e é um filme que eu acho incrível, de grande sensibilidade e com uma verdade ali. Parece quase documental também, então você entra ali no que aquela família está vivendo, no que aquela mãe está vivendo, então é um filme que eu gosto muito.
Um filme que eu assisti e gostei muito também foi o Mussum. Acho que é uma biografia extremamente bem feita, interessante, acho que a gente tem uma reconstituição de época, acho que mostra um, um personagem tão interessante de um jeito que a gente não conhece talvez, que não saiba de todas aquelas histórias.
Tem também um documentário incrível que eu queria indicar, O Outro Mundo de Sofia, do Rafa [Raphael Erichsen], que é um amigo meu. E para citar um clássico, que também é um documentário, eu citaria também Edifício Master, que é um dos filmes que eu mais gosto. Mas é isso, tem muito filme nacional bom, acho que as pessoas precisam realmente parar e dar uma chance, acho que agora no streaming tem essa possibilidade dos catálogos renovados, enfim, então daria essas dicas.
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