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Foto do escritorGabriella Ferreira

Análise | O reflexo da filmografia de Greta Gerwig em Barbie

Atualizado: 22 de set. de 2023

Diretora compreende as dores e os prazeres de ser mulher em uma sociedade patriarcal

Foto: Getty Imagens


“Hi Mom and Dad, it's me, Christine. It's the name you gave me. It's a good one. Dad, this is more for Mom. Hey, Mom, did you feel emotional the first time that you drove in Sacramento? I did and I wanted to tell you, but we weren't really talking when it happened. All those bends I've known my whole life, and stores, and the whole thing. But I wanted to tell you I love you. Thank you, I'm... thank you”.*


Em 2017, Greta Celeste Gerwig fez sua estreia na direção solo com o longa Lady Bird: É Hora de Voar. Também roteirizado por ela e descrito como uma história semi-biográfica onde conhecemos Christine, uma jovem que vive em Sacramento e que deseja estudar artes em Nova York. Quando assistimos Christine, também somos apresentados a fragmentos dessa artista que se destaca cada vez mais no cenário mundial.


Lady Bird não foi a estreia de Greta em Hollywood. Inicialmente com uma carreira voltada à atuação, é em 2008 que ela dá os seus primeiros passos nos bastidores. Com Nights and Weekends, Greta dirige e co-escreve junto a Joe Swanberg uma história sobre um casal que, mesmo apaixonado, decide terminar a relação por morar em cidades diferentes e não poder solucionar os problemas e as tensões.


Com traços muito fortes do Mumblecore, movimento artístico-cinematográfico independente, o longa mostra os primeiros passos de Greta como uma roteirista preocupada com a qualidade dos diálogos nas suas histórias. Em 2010, ela conhece Noah Baumbach e juntos os dois firmam uma parceria dentro e fora das telas que dura até hoje.


2012 marca esse início com Frances Ha, filme que ela estrela como protagonista e também trabalha como co-roteirista junto de Baumbach. Sem entrar no mérito da direção feita por Noah, temos um longa que traz uma protagonista forte e que se joga na direção dos seus sonhos, mesmo sua família e o mundo sendo contra os seus desejos.


Frances vive em Nova Iorque, mas na realidade não tem um apartamento. Ela é aprendiz de uma companhia de dança, mas não é realmente uma dançarina. Ela tem uma melhor amiga, Sophie, mas já não se falam. Assim, ela parte em busca dos seus objetivos, apesar de ser pouco provável que se realizem. Frances Ha é uma fábula moderna, que usa a cidade mais solitária do mundo como casa de uma jovem que está tentando se encontrar e captura em detalhes a forma como jovens adultos buscam lidar com a vida.


É ainda utilizando os cenários nova-iorquinos que Greta Gerwig repete a parceria com Baumbach. Co-roteirizando e protagonizando, em 2015, o filme Mistress America como a personagem Brooke Cardinas. Na história, conhecemos Tracy, uma jovem certinha e solitária, que, ao conhecer sua futura irmã postiça, Brooke, vê sua vida se transformar a partir da vida sem regras em que ela vive.


Brooke é sociável, bem-humorada, sorridente, intensa, com forte certeza sobre si mesma e suas atitudes. É uma personagem forte e cheia de nuances, em uma variação da premissa do longa anterior dos dois, onde o foco não é a busca pela autoaceitação, e sim, pelo anseio de deixar a sua marca no mundo, sendo vista e notada pelos outros.


Os diálogos espirituosos em Mistress America se repetem dois anos depois no já citado aqui Lady Bird: É Hora de Voar. O longa divisivo na carreira de Greta é marcado, novamente, pela qualidade da sua narrativa e pelas nuances subjetivas que permeiam a história de sua protagonista. As banalidades da vida e dos percalços da adolescência são transpostos na tela com a maior delicadeza possível, onde a nossa personagem principal tem uma relação dolorosamente identificável com sua mãe. Em Lady Bird, Greta tem em mãos duas personagens femininas totalmente opostas, repletas de angústias, e é nesse cenário em que ela realmente brilha, destacando um relacionamento que costuma ser complicado e onde o público feminino se depara com algo completamente identificável.


Provando o seu sucesso e sendo indicada ao Oscar de Melhor Filme, Melhor Roteiro Original e Melhor Direção, Greta chega aos holofotes de Hollywood em seu ápice e possui a responsabilidade em dar continuidade a sua carreira de sucesso como diretora. O projeto escolhido foi, somente, a sétima adaptação cinematográfica do romance de 1868 de Louisa May Alcott. Adoráveis Mulheres foi lançado em 2019 e o envolvimento de Greta levou em conta uma questão pessoal. Em uma entrevista, a diretora afirmou que o clássico da literatura foi responsável pela sua vontade de se tornar uma escritora e realizadora de cinema.


Adoráveis Mulheres é o primeiro filme blockbuster de Greta e é uma crônica de época sobre as irmãs March nos anos seguintes da Guerra de Secessão nos Estados Unidos. Acompanhamos Jo, Amy, Meg e Beth March de meninas à mulheres, cada uma com uma perspectiva e ideal diferente sobre o que é ser mulher e sobre suas próprias vontades. Greta encontrou o modo perfeito de adaptar uma história já bastante conhecida do público, dando uma profundidade bem maior às quatro irmãs protagonistas.


A escolha de uma narrativa não-linear, em uma divisão de arcos muito bem organizada, encontramos quatro mulheres que entendem de formas diferentes o papel da mulher dentro daquele século em um roteiro que não menospreza as escolhas delas, independente de quais sejam. Jo deseja se tornar uma escritora de sucesso, Meg quer casar e formar uma família, Amy quer encontrar o amor e Beth está em busca da música. Todas as decisões destas mulheres são validadas em um roteiro que desmonta a visão patriarcal de 1860.


Mas, foi na última semana que Greta Gerwig se consolidou como um dos nomes mais fortes da nova geração de diretores hollywoodianos. Ela se tornou, com a estreia de Barbie, a diretora feminina com a maior bilheteria em seu fim de semana de lançamento. Nas mãos de Greta, a responsabilidade de transpor às telas um longa esperado por anos, que se apropria da ideia da boneca mais famosa do mundo para fazer uma crítica aos padrões de beleza impostos pela sociedade.


Não era uma tarefa fácil e poderia dar muito errado. Mas, o texto de Greta e Baumbach mescla tudo isso com um deboche satírico e real do patriarcado e das pequenas felicidades e alegrias de ser mulher em uma sociedade que nos oprime diariamente. Trazendo personagens fortes, assim como nos seus longas anteriores, a Barbie de Greta Gerwig é vulnerável, sentimentalista e está aberta a descobrir o que existe além do mundo em que ela vive. Explorando novas possibilidades e enfrentando medos, ela vai em busca do seu propósito e da sua autodescoberta, algo que as personagens anteriores de Greta vivem com uma certa frequência.


Outra temática abordada em Barbie que é vista pela filmografia da diretora é a relação entre mães e filhas. Seja uma relação de cumplicidade (como vemos em Adoráveis Mulheres) ou em uma relação conturbada (Lady Bird), Greta sabe bem como demonstrar nas telas as nuances dessas relações e vemos isso em Barbie, mesmo que de uma forma um pouco mais superficial, com as personagens da Gloria e da Sasha.



Os grandes monólogos das suas personagens parece que já se tornaram marca registrada em longas de sua autoria. Em Lady Bird, a cena final contempla perfeitamente o relacionamento de Christine com sua mãe, em uma belíssima declaração de amor e de independência. Já em Adoráveis Mulheres, Jo March reflete sobre o fato das mulheres serem vistas como seres existentes apenas para amar e casar com um homem e não como pessoas complexas, que possuem sonhos, ambições e talentos.


Em Barbie, a personagem de Gloria quase que completa os pensamentos de Jo March interpretados para a sociedade atual. "É literalmente impossível ser mulher", explica ela no início. O que para alguns pareceu didático e piegas demais, para outros representou algo que não é visto com frequência em grandes blockbusters no cinema. A representação do cansaço feminino e da angústia que são vividas diariamente com o sentimento de nunca ser suficiente.


"Eu estou tão cansada de me enxergar e enxergar as outras mulheres presas em nós para que as outras pessoas gostem da gente. E se tudo isso acontece também com uma boneca que representa as mulheres, eu não sei o que fazer". Foi Gloria que falou, mas poderia ter sido eu, você ou qualquer mulher que você conhece.


Barbie é Greta Gerwig em sua total potência, deboche e crítica ao patriarcado que segura todas as mulheres (suas personagens inclusas) para trás. Recomendo fortemente se, caso você tenha gostado do filme que assistiu recentemente, visite ou reviste a obra cinematográfica de Greta pensando nessas representações femininas. É difícil não se identificar, mesmo com o sentimento agridoce, com as dores e os prazeres de ser mulher. Que bom que Greta Gerwig pode contar as nossas histórias.



* “Oi mamãe e papai, sou eu, Christine. É o nome que vocês me deram. É um bom nome. Pai, isto é mais para a mãe. Ei, mãe, você se emocionou na primeira vez que dirigiu em Sacramento? Eu sabia e queria contar a você, mas não estávamos realmente conversando quando aconteceu. Todas aquelas curvas que conheço a vida toda, e lojas, e tudo mais. Mas eu queria te dizer que te amo. Obrigada, eu sou... obrigada”.

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