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Crítica | A Conspiração Condor (Festival do Rio 2025)

  • Foto do escritor: Aianne Amado
    Aianne Amado
  • 12 de out.
  • 3 min de leitura

Com proposta ambiciosa, o filme se junta a produções recentes que revisitam  os anos de chumbo — mas peca na falta de confiança no público

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Foto: Reprodução


Na última quinta-feira, dia 09/10, aconteceu a estreia mundial de A Conspiração Condor como parte da programação do Festival do Rio. O longa-metragem dirigido por André Sturm e escrito pelo mesmo e por Victor Bonini traz uma nova versão para momentos chaves da história brasileira: as mortes, quase consecutivas, dos ex-presidentes Juscelino Kubitschek e João Goulart, durante os anos de repressão da ditadura militar.


A protagonista Silvana, vivida por Mel Lisboa, é uma jornalista de pauta cultural — ou, como ela mesma diz, de “fofoca” — que, por ventura, é designada para cobrir o funeral de JK. Lá, passa a ouvir rumores que contradizem as informações oficiais sobre o acidente. Movida pela curiosidade e pelo instinto investigativo, Silvana inicia uma apuração independente, que parece confirmar suas suposições. Quando o estranho infarto de Jango reacende as suspeitas, ela se vê mergulhada em uma teia conspiracionista que precisa manter em sigilo — especialmente de seu melhor amigo, o censor do jornal onde trabalha.


Embora os personagens centrais sejam fictícios, o enredo conspiratório se apoia fortemente em eventos reais, o que torna o argumento bastante instigante. Ao final da sessão, talvez o espectador não esteja inteiramente convencido da hipótese proposta pelo filme, mas é provável que saia com uma pulga atrás da orelha — e o Google já aberto no celular.


Reescrever a história, contudo, não é tarefa simples — ainda mais quando se trata de uma história distante no tempo e, para parte do público, pouco familiar. É preciso (1) oferecer contexto suficiente para situar o espectador no momento histórico, para que compreenda a dimensão dos fatos e personagens e, ao mesmo tempo (2) apresentar a nova versão com coerência, conferindo-lhe verossimilhança, e organização, para que faça sentido lógico.

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Foto: Reprodução


Sturm se mostra ciente desse desafio, mas tropeça ao subestimar a inteligência de seu público. O resultado é um filme excessivamente didático que, em vez de contar a história, parece querer explicá-la. Na teoria, as escolhas funcionam bem: planos holandeses para sugerir desorientação, trilha sonora tensa para indicar perigo, lentes grande-angulares para amplificar o desconforto, figurinos marcantes para caracterizar personalidades... O problema, mesmo, é a insistência. O uso reiterado desses recursos acaba diluindo o impacto que deveriam ter e, à medida que a investigação de Silvana se torna mais complexa, a linguagem cinematográfica parece se simplificar. O mesmo ocorre com o roteiro, que insiste em repetir teorias e reforçar informações, como se, temendo que o público se perdesse no caminho, escolhe levá-lo pela mão. Essa redundância sufoca o espaço para a reflexão — e, sem reflexão, o mistério perde força.


Apesar das falhas, o elenco sustenta nosso interesse. Mel Lisboa conduz a narrativa com firmeza e nuance, equilibrando excentricidade, confusão, inteligência e doçura, o que nos faz torcer por Silvana, mesmo sem necessariamente acreditar em suas convicções. Dan Stulbach e Nilton Bicudo oferecem contrapontos sólidos, reforçando a tensão dramática e ideológica da trama, elevando todas as cenas em que estão presentes. Já Pedro Bial, no papel do político decadente Carlos Lacerda, é talvez a escolha mais acertada: seu rosto e voz, imediatamente reconhecíveis (talvez dos mais identificáveis do país), bastam para dar peso e presença à figura histórica a quem dá a vida, dispensando um contra-plongée acentuado ou uma trilha épica ao fundo. Sua mera presença é um raro momento de sutileza e confiança na percepção do público.


A Conspiração Condor é um projeto ambicioso e especialmente bem-vindo para esse momento em que o cinema brasileiro parece querer repensar os tempos ditatoriais. O filme parte de uma premissa poderosa e especialmente instigante, mas se perde no desejo de ser facilmente compreendido por todos. Na tentativa de simplificar o complexo, Sturm sacrifica o espaço para a dúvida, e, com ela, o encantamento que o tema merecia.


Nota: 3/5

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