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Crítica | La Grazia (Festival do Rio 2025)

  • Foto do escritor: Guilherme Salomão
    Guilherme Salomão
  • 8 de out.
  • 3 min de leitura

Paolo Sorrentino retorna com humor mais objetivo em filme sobre a beleza das incertezas

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Foto: Divulgação


Apesar de prestigiado, o cinema de Paolo Sorrentino - diretor italiano vencedor do Oscar de Melhor Filme Internacional com A Grande Beleza - está longe de ser unanimidade entre críticos e cinéfilos. Um dos exemplos recentes desse caráter divisivo do cineasta está em sua última realização, Parthenope, que esteve na seleção internacional do Festival do Rio de 2024. Agora, pelo segundo ano consecutivo, o evento em terras cariocas recebe mais uma realização de Sorrentino. Exibido e premiado no Festival de Veneza 2025, La Grazia é um dos integrantes do panorama global do 27º Festival do Rio.


Contrariando expectativas negativas para aqueles que desgostaram de sua última realização, La Grazia pode surgir como uma boa surpresa. Isso porque, no filme, o estilo dramático e de humor excêntrico de Sorrentino volta a ser mais objetivo, depois da peculiaridade tomada por reflexões filosóficas de um filme como Parthenope. No longa, acompanhamos os últimos meses de mandato do presidente fictício italiano Mariano De Santis (Toni Servillo). Viúvo e católico praticante, na reta final do cargo, o presidente se depara com dois pedidos de perdão para presidiários e com a difícil decisão de assinar ou não uma lei sobre a eutanásia.


Logo nos créditos iniciais da película, cartelas introdutórias descrevem a função presidencial de acordo com as legislações italianas. Portanto, se a ideia é iniciar transmitindo seriedade e deveres, o retrato de Sorrentino, quando os acontecimentos do longa de fato começam a se desenrolar, é justamente sobre o contrário. Dilemas morais, éticos, existenciais e até questionamentos sobre vida pessoal são predominantes na figura de Mariano De Santis, enquanto lida com suas obrigações e com a saudade latente que sente da esposa falecida.


O presidente de Toni Servillo - vencedor do prêmio de Melhor Ator em Veneza - é um homem que, em meio a todas essas questões, chega, por vezes, a beirar o ridículo. Há momentos em que, por exemplo, se diz determinado a aprender a composição de rap ou demonstra uma obsessão inexplicável em descobrir com quem sua esposa teria tido um caso quase quatro décadas antes do tempo presente do longa.

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Foto: Divulgação


O humor de Sorrentino, quanto a isso, funciona pois a todo instante está alinhado com a ideia de desconstrução da imagem de autoridade e respeito que a função de presidente, como indicado pelas mencionadas cartelas iniciais, traz consigo. O estilo contemplativo característico do cineasta, de grandes locações e planos que ressaltam uma beleza estética predominante, também funciona com mais assertividade. Há momentos em que Sorrentino escolhe retratar os momentos finais do mandato do chefe de estado italiano em isolamento, com planos gerais que moldam a solidão de um indivíduo enquadrado sozinho em meio às paredes e estruturas robustas da residência presidencial ou com a imensidão de um belo céu azul ao fundo.


Assim, De Santis está longe de ser um personagem unidimensional. E o que faz do filme de Sorrentino ser um retrato de fato interessante é o rumo que essa jornada toma em sua parcela derradeira. Em meio ao ridículo e à solidão, o presidente retratado pelo diretor é, acima de tudo, um homem vidrado em certezas - respostas exatas para todas as questões que fazem parte de sua existência, bem como de suas obrigações. Mas é bonito como o personagem de Servillo, aos poucos, aprende a enxergar a beleza de se viver rodeado por dúvidas.


Como descrito por um dos personagens em determinado instante do filme, viver com esse benefício é, justamente, a “Graça” existencial que nomeia a película. O mandato de De Santis chega ao fim, mas suas objeções não são completamente resolvidas. Ao longo da vida, talvez nunca tenhamos plena certeza de nada. Porém, assim como Mariano De Santis, quando se trata do perdão aos presos e da lei da eutanásia, sejamos sempre obrigados a realizar escolhas e seguir em frente, mesmo que cercados de incertezas.


Nota: 4/5

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